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Duda Beat: ‘No terceiro disco, eu sou essa mulher que sai de casa para ver qual é’

12 de abril, 2024 / Por: Agência O Globo

Aos 36 anos, cantora pernambucana lança ‘Tara e tal’, álbum no qual revive os sons dançantes e eletrônicos das noites de sua adolescência e, sem deixar a sofrência de lado, fala de desejo: ‘Tudo que eu escrevo é muito autobiográfico’

Duda Beat: ‘No terceiro disco, eu sou essa mulher que sai de casa para ver qual é’
Capa do álbum “Tara e tal”, da cantora Duda Beat — Foto: Reprodução

A ansiedade dos fãs por um álbum de Duda Beat é algo com o qual a cantora pernambucana de 36 anos hoje em dia faz graça.

— As pessoas ficam comentando nas coisas que eu posto: “Ai, lá vai a Eduarda de novo fazer um disco para eu sofrer pelo meu ex imaginário!” — brinca ela. — E é bem isso mesmo, eu tento me lembrar muito das coisas que eu vivi. Fui uma menina que se apaixonou muito, que se apaixonava muito fácil, e que por muito tempo não foi correspondida. Eu sempre tô chorando para depois sorrir. Então, tenho muita história para contar.

Mas agora, com este seu terceiro álbum, “Tara e tal”, que chega ao streaming às 23h desta quinta-feira, a coisa é um pouco diferente. A começar pela sonoridade – um coquetel dançante que recupera estilos da música eletrônica dos anos 1990 e 2000, como a house, o Miami bass e o drum’n’bass, misturando-os aos da música eletrônica mais atual, como Jersey club, drill e future bass. É um disco, em suas palavras, de um “passado futurista” – seria o seu “Future nostalgia” (título que, ela lamenta, estrela inglesa Dua Lipa pegou antes), da mulher madura que se espelha na adolescente que um dia foi:.

— Sinto que essa terceira etapa, esse terceiro disco, aponta para esse lugar da diversão, depois de toda aquela tristeza e vulnerabilidade do primeiro e do segundo. Sem perder isso (a sofrência), claro, mas dando uma camada a mais, de desejo — diz. — No primeiro disco (“Sinto muito”, de 2018) eu sou uma mulher super iludida, romântica e apaixonada. No segundo (“Te amo lá fora”, 2021) eu já estou mais fortalecida, mais com um pé na realidade, falando “ok, ninguém é obrigado a me amar, tudo bem, vamos lá”. No terceiro, eu sou essa mulher que sai de casa para ver qual é.

Da mesma forma que Duda se arriscou nas sonoridades de suas novas músicas — como “Drama”, “Saudade de você” (um Miami das antigas, bem de baile da Furacão 2000), “Teu beijo” (um drum’n’bass que lembra DJ Patife e Kaleidoscópio), “Preparada”, “Desapaixonar” —, a personagem das letras se joga na vida:

— Em termos de composição, sinto que era uma terceira etapa muito importante de seguir, essa etapa em que você perde a vergonha de admitir que desaprendeu um pouco a paquerar, mas mesmo assim você se arrisca. “Tara e tal” fala muito sobre essa mulher 30 mais, que é onde eu me encaixo. Essa mulher que está ali dançando, no meio da noite, mas ainda tem aqueles pensamentos no ex.

Musicalmente, o novo disco leva Duda Beat de volta ao começo da década de 2000, tempo “em que a gente ia para Porto de Galinhas, Maracaípe, e tinha essas tendas eletrônicas na praia”.

— Chegávamos eu e as e minhas amigas e estava tocando DJ Marky, Miami bass, todas essas coisas eletrônicas misturadas com Brasil. Olhei para esse momento e quis muito resgatar isso. Além de ser uma coisa que as pessoas não estão fazendo agora, foi uma fase da minha vida que eu me diverti — conta.

Criança que cresceu ouvindo Pearl Jam e Soundgarden com o pai, Duda buscou inspiração no grunge para a capa e as guitarras pesadas de “Tara e tal” (“quando saiu o meu segundo disco, meu pai falou assim: “ah, eu adoro suas músicas, minha filha, mas tá faltando som de guitarra!”, recorda-se). Mas, em “Tara e tal”, não podia faltar o componente recifense: Lúcio Maia, ex-Nação Zumbi, participa do disco recriando sua guitarra de “Coco dub” (faixa de “Da lama ao caos”, álbum de estreia de Chico Science & Nação Zumbi, que completou 30 anos esta semana), na faixa de abertura do disco, “Drama”.

— Chico Science foi o cantor mais revolucionário que eu conheço, porque ele fez exatamente uma coisa que eu amo, que é misturar as coisas que a gente tem com outras muito futuristas — conta ela. ­— O meu nome veio do Mangue Beat, então, sempre que posso, trago referências de ritmos e de coisas que aconteceram na minha terra. Fiz muita música para esse disco e, entre as que tiveram que sair, estava um frevo meio acelerado. Mas, em algum momento, vou lançar ele.

‘Tudo que eu escrevo é muito autobiográfico’

Como de costume, as letras de “Tara e tal” prometem dar muito pano para as mangas de quem confunde a a persona artística de Duda Beat com a sua persona privada.

— Até eu me confundo às vezes! Imagina, eu trabalho com o meu marido (Tomás Tróia, que produziu o disco junto com ela e Lux), a gente faz as coisas juntos… fica tudo misturado mesmo — admite. — Tudo que eu escrevo é muito autobiográfico. Com 28, eu comecei a escrever as canções e com 30 eu lancei meu primeiro álbum. Para muita gente isso é tarde, mas para mim foi maravilhoso, porque eu consegui entrar nessa história muito madura. Aquele primeiro disco serviu muito para mim como cura, eu precisava colocar para fora aquela história, precisava sentir que outras pessoas sentiam aquilo junto comigo.

Para ela, “é realmente difícil de separar a Duda Beat da Eduarda”.

— Até hoje assim a minha analista fica assim: “você precisa se dar umas férias minha filha!” — ri. — As pessoas confundem muito porque no fundo eu acho que é a mesma coisa. Acho que a persona da Duda Beat veio aí talvez pra curar a ferida desses amores não correspondidos, dessa falta de autoestima.

Hoje, porém, a menina rejeitada tornou-se uma estrela, uma mulher amplamente desejada:

— Mas dentro de mim é como se nada tivesse mudado, em muitos momentos eu ainda me sinto aquela mesma menina. Em outros, eu me dou conta de que não eu não sou mais, que estou curada. Acho que talvez seja por isso que sou uma boa compositora, estou sempre ali naquele limbo entre entender o que eu me tornei e me lembrar do que eu fui. É muito difícil se dar conta do que a gente se tornou.

‘Não sou aquela artista que fecha os olhos’

Em alguns momentos, Duda Beat sofreu ao ser jogada às feras da mídia e das redes sociais, mas também se sentiu muito abraçada, acolhida.

— Eu leio as coisas que as pessoas escrevem sobre mim, não sou aquela artista que fecha os olhos. O que eu sinto que é para eu aprender, eu escuto de verdade. Onde eu vejo que errei, eu digo que errei e peço desculpas. A gente é ser humano, né? — argumenta ela, para quem o hate das redes não a afeta tanto mais. — Eu tento pensar que isso é muito mais problema de quem tá escrevendo do que meu assim. Isso é o que a maturidade traz pra gente, de pensar assim: “OK, essa pessoa não está num bom dia, que pena.”

Para Duda, o momento atual não poderia ser melhor. Nos últimos tempos, ela conheceu pessoalmente de Lana Del Rey e Sam Smith (e agora, espera conhecer Lady Gaga e Serj Tankian, cantor do grupo System of a Down), está estudando espanhol e inglês e em novembro assinou contrato com a Universal Music. O sonho da carreira no exterior começa a tomar forma:

— A gente quer trabalhar esse disco lá fora, sim, ele tem uma pegada muito internacional. E tenho muita vontade de fazer feats internacionais, tem pessoas com quem eu já tenho conversado e acho que vai rolar em algum momento. Mas agora eu quero muito mais é me expandir aqui no Brasil, o foco agora é nesse show novo e nessa minha turnê, que eu estou lutando para fazer, nesse momento em que a gente sabe que os festivais estão comandando todos os lugares.

A “Tara & Tour”, que ela define como “um ato de resistência”, começa dia 16 de maio em São Paulo (no Espaço Unimed) e segue dias 18 em Fortaleza (Náutico Clube), 08/06 em Ribeirão Preto (no João Rock Festival), 14/06 no Rio de Janeiro (Circo Voador), 22/06 em Porto Alegre (Auditório Araújo Vianna), 29/06 em Belo Horizonte e 17/08 em Brasília (em locais a ser definidos).

— (Essa turnê) é muito importante, porque nos festivais a gente tem uma hora contada, não dá para a gente mostrar o nosso sonho inteiro, o que que a gente preparou — alega. — E esse meu show novo tem três atos (fim de tarde início de noite e o auge da noite), é um show em que a luz é muito importante, então, se eu vou tocar num festival de dia, talvez a luz não seja tão protagonista quanto eu gostaria fosse. E o fã, o fã mesmo, raiz, ele quer ter essa experiência completa do show, ele quer ouvir as músicas que eu já não toco há um tempo.

‘Senti que tinha batido num teto’

Para Duda Beat, os tempos de artista independente foram importantes “porque eu consegui entender o meu valor no mercado”. Mas, reconhece, era mais do que hora de se arriscar numa grande gravadora:

—O independente me deu a noção do que se gasta e do que se ganha. Mas eu senti que tinha batido num teto, que eu tinha chegado num lugar que eu conseguia ultrapassar, que não fosse com contatos internacionais ou com uma maior exposição na mídia. E, para a gravadora, é um desafio pegar uma cantora como eu, uma cantora um pouco fora da curva, que de certa forma não é tão comercial. Acabou sendo uma responsabilidade de nós dois, e um negócio bom para os dois.

Partidária do governo Lula, com quem posou para fotos, Duda Beat é uma das artistas que vivem a dor e delícia de se posicionar politicamente no Brasil de 2024.

— A delícia é fazer com que as pessoas me conheçam de fato verdadeiramente assim, principalmente os meus fãs. Eu quero que eles saibam o que eles estão consumindo. Quando você é transparente, não tem não tem brecha para dúvidas — observa. — Eu não sei qual a dor… talvez metade da população não vá comprar o meu barulho por isso, mas talvez a minha canção conquiste eles de alguma forma, talvez até eles não precisem me seguir nas redes sociais para serem meus fãs. Para mim, ser clara com as pessoas que estão comigo que estão me acompanhando, passa por cima disso tudo.


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