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2,6 milhões morrem por causa de álcool a cada ano; 90 mil no Brasil

25 de junho, 2024 / Por: Agência O Globo

Consumo diminuiu de forma tímida nos últimos 20 anos, mas número de mortes continua ‘inaceitavelmente alto’, diz Organização Mundial da Saúde

2,6 milhões morrem por causa de álcool a cada ano; 90 mil no Brasil
Consumo excessivo episódio de álcool — Foto: freepic.diller no Freepik

O álcool foi responsável pela morte de 2,62 milhões de pessoas, 4,6% do total, em 2019, último ano sobre o qual há dados disponíveis, mostra o novo relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre o tema, publicado nesta terça-feira. No Brasil, foram 91,9 mil óbitos, a maioria, 80,4 mil, entre homens.

O documento revela que globalmente cerca de 400 milhões de pessoas, o equivalente a 7% da população acima de 15 anos, vivem com um transtorno por uso do álcool. De acordo com a OMS, o termo engloba dois casos: a dependência de álcool, que é mais grave e afeta 209 milhões desses indivíduos, e um padrão nocivo de consumo.

“O uso de substâncias prejudica gravemente a saúde individual, aumentando o risco de doenças crônicas, problemas de saúde mental e, tragicamente, resultando em milhões de mortes evitáveis todos os anos. Ele impõe um pesado ônus às famílias e comunidades, aumentando a exposição a acidentes, lesões e violência”, diz o diretor geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, em comunicado.

O levantamento estava previsto para ser publicado em 2022, mas precisou ser adiado devido à pandemia, explicou em coletiva de imprensa realizada nesta segunda-feira Vladimir Poznyak, chefe de Unidade, Álcool, Drogas e Comportamentos Viciantes, Departamento de Saúde Mental e Uso de Substâncias da OMS:

— Todo o exercício de coleta de informações de todos os países leva pelo menos um ano. E a verificação dos indicadores dos países antes da divulgação leva mais um tempo. No entanto, a pandemia de Covid-19 propôs desafios significativos (…) Agora, continuamos nossos esforços para especificar os dados de 2020 e 2022, e esperamos que estejam disponíveis no próximo ano.

O novo relatório aponta que, de 2010 até 2019, houve uma redução tímida no consumo de álcool mundial, de 4,5%, saindo de uma média de ingestão per capita de 5,7 litros de álcool puro por ano para 5,5 litros. Dados preliminares de 2020 indicam ainda uma redução de 10% no ano devido à pandemia, chegando a 4.9 litros, contou Poznyak.

— Entretanto, as tendências não são as mesmas em diferentes jurisdições e populações. Em alguns países, os dados mostram um aumento — disse. Ele explicou que um consumo atrelado a festas e eventos diminuiu por conta do isolamento social, mas que a OMS observou um crescimento entre pessoas que recorreram à bebida para lidar com o “estresse psicossocial” da crise sanitária.

Além disso, Poznyak destacou que “apesar da redução, o número total de mortes continua inaceitavelmente alto”. Embora algumas diretrizes, como as americanas, estabeleçam que um consumo seguro de álcool seria de até duas doses por dia, no caso dos homens, e de uma dose diária, no das mulheres, a OMS defende que não há ingestão inofensiva.

— A posição que destacamos é que não existem níveis de consumo de álcool sem riscos. O que está claro é que os riscos associados a qualquer nível de consumo dependem de diversas variáveis, incluindo o contexto do uso de álcool. (…) A OMS não produziu essas diretrizes devido à diversidade de países, seria uma tarefa impossível de gerenciar — afirmou.

O documento revela que os índices de mortes pelo consumo de álcool são maiores em países de baixa renda. No geral, entre os 2,62 milhões de óbitos, 474 mil foram por doenças cardiovasculares, e 401 mil por casos de câncer.

Outras 724 mil vítimas fatais foram resultantes de acidentes de carro, lesões autoprovocadas e violência entre pessoas. Houve ainda 284 mil mortes relacionadas a infecções transmissíveis. A maior proporção das mortes (13%) ocorreu entre adultos de 20 a 39 anos.

— O álcool age como uma nuvem de pólen sobre todo o corpo. Pega todos os órgãos, coração, pulmão, rins, sistema nervoso. As principais doenças causadas são primeiro a dependência do álcool, que é uma situação gravíssima. Perde família, emprego, autoestima. E junto normalmente ocorre a cirrose alcoólica, que só se resolve se a pessoa parar completamente de beber. Tem a miocardiopatia alcoólica, o coração fica mais inchado, traumatismo cranioencefálico é comum devido a quedas alcoolizados, no pâncreas tem a pancreatite aguda. O álcool está ligado a 200 doenças — avalia Arthur Guerra, psiquiatra e presidente executivo do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa).

Tendência do consumo

Apesar da pequena queda no consumo per capita para 5,5 litros de álcool puro, a média é mais elevada nas regiões da Europa (9,2 litros) e das Américas (7,5 litros).

Além disso, entre os consumidores regulares de bebidas alcoólicas pelo mundo, que corresponderam a 43,8% da população acima de 15 anos, a média de ingestão é de 27 gramas da substância por dia, o que equivale a cerca duas doses – duas latas de cervejas, duas taças de vinho ou duas doses de destilados.

Entre os mais jovens, de 15 a 19 anos, 23,5% são consumidores regulares de álcool.

— É importante observar o consumo per capita por consumidor porque é o que mostra quais são os níveis de consumo entre aqueles que bebem álcool pelo mundo — destacou Poznyak.

38% desses indivíduos se envolveram num episódio de “beber pesado”, definido como a ingestão de pelo menos 60 gramas de álcool puro (mais de 4 cervejas, 4 taças de vinho ou 4 doses de destilado) em apenas uma ocasião no último mês.

— O beber pesado episódico, ou binge drinking, que tem aumentado no Brasil, nos preocupa mais porque afeta especialmente jovens que usam o álcool como uma bengala, como o principal instrumento para se divertirem no fim de semana. O objetivo é beber, e beber muito. Essa é uma enorme preocupação, são episódios associados a eventos agudos, como acidentes automobilísticos, brigas, gravidez indesejada, infecções sexualmente transmissíveis — diz Guerra.

No Brasil, os percentuais foram maiores: 58,1% de toda a população acima dos 15 ingere bebidas alcoólicas regularmente, e 40,8% dos jovens de 15 a 19. No geral, 35,3% deles se envolveram num episódio de “beber pesado”.

Além disso, o consumo no país é mais elevado de um modo geral: 7,7 litros de álcool puro per capita por ano, contra os 5,5 litros da média mundial.

— Em 2010, o consumo per capita era 8.8 e, em 2016, foi 7.8. Hoje, 7.7. Essa redução foi otimista, mas agora estagnou. Tinha uma expectativa de que estaria melhor no novo levantamento. Mas ainda assim o consumo no Brasil está reduzindo, diferente de alguns países que estão aumentando — afirma o presidente do Cisa.

Ele defende ainda que é preciso mais medidas direcionadas ao combate do consumo elevado de álcool, especialmente por meio da educação sobre os riscos e com foco na população mais jovem.

— Vejo ações ainda muito tímidas. Não temos um programa de prevenção específico voltado para a juventude. São atitudes quase românticas em relação ao álcool. Não há trabalho de médio e longo prazo. Há ações que começam num governo e no outro terminam. Não se aborda o assunto nas escolas, nas empresas. Prevenção é educação, informação.


BS20240625123811.1 – https://oglobo.globo.com/saude/noticia/2024/06/25/oms-26-milhoes-de-pessoas-morrem-por-causa-de-alcool-a-cada-ano-90-mil-no-brasil.ghtml