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SAÚDE

Aborto legal: ‘A criança de 10 anos que engravida tem risco de morte até 5 vezes maior por complicações na gestação’, diz obstetra

18 de junho, 2024 / Por: Agência O Globo

OMS informa que há chances mais elevadas de eclâmpsia, endometrite puerperal e infecções nas crianças e adolescentes do que em mulheres adultas

Aborto legal: ‘A criança de 10 anos que engravida tem risco de morte até 5 vezes maior por complicações na gestação’, diz obstetra
Foto: freepik

Embora meninas de até 9 ou 10 anos possam engravidar após um estupro por já ter acontecido a primeira menstruação, isso não quer dizer que o corpo delas está preparado para levar uma gestação até o fim de forma saudável.

O ginecologista Olímpio Moraes, diretor médico da Universidade de Pernambuco explica que há pelo menos 14 mil gestantes abaixo de 14 anos e só 4% dessas meninas têm acesso ao aborto por estupro. Para muitas dela, a gravidez é um perigo á saúde.

— Uma menina de 10 anos tem risco de morte de duas a cinco vezes maior por complicações na gestação e sequelas — explica o ginecologista Olímpio Moraes, diretor médico da Universidade de Pernambuco.

O médico também explica que há graves prejuízos à saúde mental dessas meninas:

— No Brasil, a principal causa de mortes de adolescentes são complicações da gravidez e suicídio devido à violência sexual.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), as mães crianças e adolescentes (com idades entre os 10 e os 19 anos) enfrentam riscos mais elevados de eclâmpsia, endometrite puerperal e infecções sistémicas do que as mulheres com idades entre os 20 e os 24 anos.

Além disso, ainda segundo a OMS, os bebês de mães adolescentes enfrentam riscos mais elevados de baixo peso à nascença, parto prematuro e condições neonatais graves.

Dados da Academia Americana de Pediatria mostram que as menores grávidas têm maior probabilidade de desenvolver hipertensão e anemia relacionadas com a gravidez e de sofrer trabalho de parto prematuro (precoce) do que as mulheres mais velhas.

As adolescentes também têm maior probabilidade de não saber que acabaram contraindo uma infecção sexualmente transmissível (IST), que podem ocasionar problemas à gravidez ou ao feto.

As adolescentes costumam ter menos chances de receber cuidados pré-natais ou de comparecer às consultas.


BS20240618030057.1 – https://oglobo.globo.com/saude/noticia/2024/06/18/aborto-legal-a-crianca-de-10-anos-que-engravida-tem-risco-de-morte-ate-5-vezes-maior-por-complicacoes-na-gestacao-diz-obstetra.ghtml


Aborto legal: Federação Internacional de Ginecologia condena restrição no Brasil: ‘antiético e contradiz as evidências médicas’

Entidade criticou medida para impedir a interrupção da gravidez nos casos contemplados pela lei brasileira após o período de 22 semanas

A Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (Figo) publicou um posicionamento, nesta segunda-feira, em que critica a restrição ao aborto legal no Brasil e diz que movimento é “antiético e contradiz as evidências médicas”.

O documento refere-se à resolução do Conselho Federal de Medicina ( CFM), de abril deste ano, que proibiu a realização da assistolia fetal, procedimento necessário para interromper a gravidez em fases mais avançadas.

Na prática, a medida impedia que médicos realizassem o aborto depois da 22ª semana, mesmo nos casos previstos pela lei brasileira, como fruto de um estupro ou com risco à vida da mulher. A resolução foi suspensa pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que acatou uma ação protocolada pelo PSOL.

No posicionamento, a Figo ressalta que a proibição da assistolia fetal se desvia das recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), que é contra a imposição de limites de tempo ao aborto legal, e diz expressar “profunda preocupação”.

Sem a indução da assistolia fetal, continua, o abortos em questão “se tornam impossíveis de serem realizados, e as mulheres serão forçadas a continuar a gravidez e assumir os riscos do parto e da maternidade forçada, ou recorrer a abortos muito inseguros”.

A federação afirma ainda que resolução do CFM “priva os profissionais de saúde da capacidade de defender os direitos das mulheres e meninas reconhecidos pela legislação brasileira” e que “estabelece um precedente perigoso para toda a região, ameaçando o progresso significativo feito nessa área nos últimos anos”.

Hoje, no Brasil, a interrupção da gravidez é permitida quando há risco de vida para a mulher e quando a gestação resulta de um estupro, de acordo com o Código Penal, além dos casos em que há anencefalia do feto, por entendimento do STF. Para todos os casos, não há limite de tempo gestacional.

É o que foi destacado, inclusive, por Moraes ao suspender o texto do CFM. Segundo a decisão do ministro, há a possibilidade de o Conselho ter ultrapassado sua competência regulamentar ao impor ao profissional médico e à paciente uma restrição não prevista em lei.

PL Antiaborto

Em movimento semelhante ao do CFM, a Câmara dos Deputados aprovou um pedido de urgência para o projeto de lei que equipara o aborto realizado após 22 semanas ao crime de homicídio simples, mesmo nos casos autorizados pela legislação brasileira, que ficou conhecido como PL Antiaborto.

Em nota, a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) se posicionou “contra a criminalização da mulher nessa situação de vulnerabilidade” e pediu a retirada do texto da pauta da Câmara.

Já o Conselho Nacional de Saúde (CNS) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) solicitaram o arquivamento do PL. Em parecer técnico-jurídico, a OAB declarou que o projeto é inconstitucional.

O que é a assistolia fetal?

A assistolia fetal, procedimento que está no centro do debate tanto da resolução do CFM, como do PL Antiaborto, é um método recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) quando a gestação é interrompida acima de 20 semanas, segundo as últimas diretrizes divulgadas em junho de 2023.

Ela consiste na injeção de determinados agentes farmacológicos, geralmente o cloreto de potássio, para interromper os batimentos cardíacos do feto, que depois é retirado da barriga da mulher para completar o procedimento do aborto.

Na época da resolução do CFM, Rosires Pereira, presidente da Comissão Nacional Especializada em Violência Sexual e Interrupção Gestacional Prevista em Lei da Febrasgo, explicou que a assistolia é indispensável:

— Sem a conduta da assistolia fetal, a interrupção da gravidez tardiamente não pode ser realizada. Porque o direito na Lei é para um aborto que tire a vida do feto. Mas a indução do parto nessa fase gestacional pode levar ao nascimento de bebês com vida e com risco de diversos problemas de saúde, como questões neurológicas. E a Lei não define limite de idade.

É o que defendeu também o ginecologista Olímpio Moraes, diretor médico da Universidade de Pernambuco e referência em aborto legal no país, em entrevista ao GLOBO:

— Os estudos mostram que (a assistolia fetal) é indolor para o feto. Com o feto morto, se induz o aborto, e será expulso via vaginal. Não é um parto. Outra mentira é que esse procedimento é feito com oito ou nove meses. Isso não ocorre. Existe um ou outro caso de sete meses, como aquele de Santa Catarina, porque enclausuraram a menina por motivações ideológicas.

Pereira da Febrasgo lembrou ainda que muitos casos chegam a idades gestacionais avançadas devido a fatores como a baixa oferta de serviços no país, a burocracia necessária para acessar o direito, como exames e, por vezes, autorização judicial, e o fato de grande parte dos casos serem em menores de idade que foram violentadas:

— Como temos poucos serviços que o fazem, muitas mulheres não têm acesso no início da gestação. Outro ponto é que meninas de 10, 11 anos que engravidam por um estupro demoram para buscar o procedimento, porque muito frequentemente a violência vem da própria casa, de familiares. Podem demorar até mesmo para notarem as mudanças corporais. E há muitos casos de violência em que as mulheres são mantidas em cativeiro — continuou.


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