POLÍTICA

ADPF das Favelas e segurança causam embaraços nas bases de Paes e Castro

3 de março, 2025 | Por: Agência O Globo

Ação que resultou em decisão do STF com exigências para operações policiais nas favelas do Rio foi apresentada pelo PSB e é defendida por petistas, ambos aliados do prefeito de olho em 2026

Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

O protagonismo da segurança pública nos embates que antecipam a eleição estadual de 2026 vem acompanhado de embaraços para o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), e o governador Cláudio Castro (PL). No caso de Paes, provável candidato ao Palácio Guanabara no ano que vem, a controvérsia se dá com partidos aliados que são favoráveis à chamada ADPF das Favelas, que impõe exigências técnicas para a realização de operações policiais no estado. Foi o PSB, sigla que faz parte da gestão carioca, quem apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) a ação que conseguiu decisão favorável do ministro Edson Fachin para restringir as incursões, ainda no contexto de pandemia.

Figuras do PT também deram declarações pró-ADPF nas últimas semanas, mas, assim como no PSB, elas evitam se opor abertamente à postura do prefeito. Em fevereiro, a prefeitura do Rio entrou como parte interessada no processo, defendendo a derrubada da ADPF. Paes sustenta que, além de ser errada na origem, porque não caberia ao Supremo definir as circunstâncias de operações policiais, a ação virou uma desculpa para o governo do estado se eximir de responsabilidade na segurança pública. Segundo a pesquisa Genial/Quaest, a violência é considerada o principal problema por 71% dos fluminenses, patamar muito superior ao dos demais estados.

Presidente estadual do PSB, o ex-deputado Alessandro Molon é um dos interessados em disputar o Senado no ano que vem na eventual aliança de Paes. Interlocutores veem caminhos para a contradição envolvendo a ADPF ser explorada em duas frentes por opositores. Contra o prefeito, haveria o discurso de que, apesar de ter se colocado anti-ação na Corte, um aliado importante foi o autor dela. Já para criticar Molon, o próprio argumento de que ele “não quer que a polícia trabalhe”, forma como a direita vende os sentidos da ADPF, seria usado para prejudicá-lo na busca pelo Senado.

Mesmo com as restrições impostas pela decisão de Fachin, diversas operações policiais são registradas no Rio. O governo alega, no entanto, que a ação no STF prejudica a “ostensividade” da polícia ao criar a exigência de “extraordinariedade” para que se empreenda uma incursão em favela.

Apesar de também ser crítico da ADPF, Paes diz que o estado a coloca como desculpa para não resolver problemas que se dão em áreas que não são favelas, como os bairros ocupados pelo “Complexo de Israel”, na Zona Norte.

Além do PSB, autor da ação, há discordâncias com Paes no PT, que tem três secretarias na prefeitura. O ex-adversário e agora aliado Marcelo Freixo, presidente da Embratur, chegou a publicar um vídeo no Instagram em que defende abertamente a ADPF. O ex-deputado, no entanto, não mencionou o prefeito na gravação — concentrou as críticas em Castro. Molon também evita comentar o movimento de Paes pelo fim da medida.

“Operação tem que ter planejamento, feito com o rigor da lei, feito com capacidade de combater o crime, e não desajustar completamente a vida de uma comunidade inteira”, disse Freixo. “O grande problema do Rio de Janeiro é a falta de uma autoridade pública, de ter um governador que seja exemplo para a polícia.”

Reação de Castro

Castro, por sua vez, intensificou comentários e ações sobre segurança desde que Paes passou a mergulhar no assunto. A fim de não deixar o adversário tomar conta da pauta, tem feito discursos duros, com direito a frases contra “o pessoal dos direitos humanos”.

No governo, contudo, reclama-se que Castro acaba atuando sozinho na defesa da própria gestão, hoje mal avaliada. Nomes cotados para representar a sucessão do governador na próxima eleição pouco agem para proteger o governo.

Um movimento feito para tentar disputar a narrativa da segurança foi a criação de uma agência estadual de notícias sobre o tema — com uma página no Instagram, @naescutarj — , em que são publicados vídeos com críticas a leis penais ou de divulgação do trabalho policial.

Perguntas como “Saidinha do presídio: benefício pra quem?”, “Por que certas leis só valem pra um lado da sociedade?” e alertas como “A polícia prende, a lei solta” são acompanhados de gravações e musiquinhas alarmantes. Também há conteúdos nos moldes dos produzidos por policiais influenciadores. É o caso do vídeo “Top 3 armas inusitadas apreendidas no Rio” e “POV: por dentro do blindado”.

O que é a ADPF das Favelas

Ajuizada em 2020 pelo PSB, a ADPF 635, que teve liminar concedida pelo ministro Edson Fachin, determina que as operações têm que se dar em casos excepcionais e devidamente justificados pelo estado. A ação se deu no contexto da pandemia de Covid-19.

A medida foi adotada depois de uma operação deixar 13 mortos no Complexo do Alemão em plena crise pandêmica.

Apesar das críticas das autoridades, um estudo do MP-RJ diz que “entre 2021 e 2024, o número de operações aumentou e a letalidade diminuiu”.

O governo do estado e o bolsonarismo dizem que a ADPF atrapalha o trabalho da polícia, já que acaba com a ideia de “ostensividade” ao exigir a “extraordinariedade” para as operações.

Já Eduardo Paes adota o meio do caminho: concorda que a ação é equivocada, porque o STF não deveria se envolver no tema, mas critica o uso da ADPF como desculpa pelo governo estadual.

No início de fevereiro, a ação passou a ser julgada pelo colegiado do Supremo, mas o julgamento foi suspenso logo após o voto do relator Fachin.


BS20250303063019.1 – https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2025/03/03/adpf-das-favelas-e-seguranca-causam-embaracos-nas-bases-de-paes-e-castro.ghtml

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