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Atriz, cantora, ativista e artista visual, Zahy Tentehar celebra suas origens indígenas em ‘Falas da Terra

15 de abril, 2024 / Por: Agência O Globo

’Vinda da aldeia Colônia, no Maranhão, para o Rio a fim de ‘tentar a sorte’, artista ganhou prêmio de teatro e hoje reverencia a mãe, primeira pajé mulher da reserva de Cana Brava: ‘Ela tinha uma sensibilidade muito grande, eu busco isso também’

Atriz, cantora, ativista e artista visual, Zahy Tentehar celebra suas origens indígenas em ‘Falas da Terra
A atriz Zahy Tentehar — Foto: Divulgação

Muita coisa aconteceu na vida de Zahy Tentehar, hoje com 34 anos, desde que ela veio para o Rio de Janeiro, aos 19, “tentar a sorte”, como conta ao Globo a atriz, cantora e ativista nascida na aldeia Colônia, no território indígena Cana Brava, no Maranhão. É ela quem apresenta o especial “Falas da Terra”, que a TV Globo exibe esta segunda-feira, após o Big Brother Brasil.

Com direção artística de Antonia Prado, direção de Felipe Herzog, e roteiro assinados pelos dois e por Daniel Munduruku, Micheline Alves e Veronica Debom, o programa propõe um mergulho na cultura dos povos originários, refletindo sobre um futuro no qual as necessidades econômicas, a preservação ambiental, a garantia de direitos coletivos e as liberdades individuais coexistam para esta população de quase um milhão e setecentos mil brasileiros. No programa, Zahy vai cantar “Um índio”, de Caetano Veloso, com Maria Gadú.

‘De paraquedas’

Quando chegou aqui, Zahy buscou abrigo na Aldeia Maracanã, espécie de aldeia urbana formada por um movimento que ocupa, desde 2006, o antigo Museu do Índio, ao lado do estádio na Zona Norte do Rio. Ali, a jovem de Cana Brava fez coro aos inúmeros protestos empreendidos para manter a aldeia de pé. Num deles, um vídeo em que ela discursava viralizou e chegou até o diretor Luiz Fernando Carvalho, que à época procurava uma atriz indígena para a série “Dois irmãos”. O resto é ma’emume’u (“história”, na língua tentehar).

— Ele fez testes com outras atrizes, mas queria uma com vivência e que falasse língua originária. O teste era cantar uma canção de ninar, eu tinha 23 anos. Foi meu primeiro trabalho, não busquei isso como sonho. Posso dizer que caí de paraquedas. Depois fiz um longa, o “Não devore meu coração”, fui paro o teatro fazer “Macunaíma”, da Bia Lessa, e meu interesse pela atuação foi se desenvolvendo ao longo do processo — conta.

Zahy é a caçula de 33 irmãos — “esses a gente tem certeza, pode ter mais”, ela observa. Sua mãe é uma figura histórica: foi a primeira pajé mulher da reserva indígena de Cana Brava. Morreu em 2021 devido a uma infecção generalizada. Ela é reverenciada pela atriz no espetáculo musical “Azira’i”, que ficou em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil no ano passado, já passou por cidades como Curitiba e São Paulo, e pelo qual Zahy ganhou o último Prêmio Shell de melhor atriz de teatro no Rio.

— Minha mãe é a minha maior referência. Tinha uma personalidade muito desprendida do julgamento das outras pessoas. Isso é uma coisa que eu sempre busco em mim. Na cidade, a gente está constantemente preocupado com o julgamento dos outros. Ela era cega e fazia piada sobre isso. Dizia: “estou enxergando tudo”. Ela tinha uma sensibilidade muito grande, eu busco isso também, e isso me ajudou a desenvolver habilidades artísticas.

As coisas vêm dando certo, é verdade, mas Zahy ainda estranha alguns hábitos da cidade:

— O que eu sinto mais falta da aldeia é esse sentimento de coletivo. Aqui na cidade é muito cada um por si. Tudo é negócio, até amizade e relacionamento são negócios. Isso pra mim ainda é um choque.

Outros projetos

Como artista visual, Zahy expôs instalações em coletivas em Nova York, no Rio e em São Paulo. Na TV, está no elenco de “No Rancho Fundo”, novo folhetim das 18h, sua estreia numa novela. No streaming, tem presença confirmada nas séries “Americana”, da Star+, e “Tarã”, da Disney+. No cinema, se prepara para rodar “Sisters of Lucia”, do diretor alemão Akiz IKon, ambientado na Rocinha. Com a correria, Zahy diz que está cansada, mas se mostra empolgada não só pelo lugar conquistado, como também pela representatividade.

— Fazer o “Falas da Terra” foi bem intenso. Um prazer fazer esse tipo de trabalho. Os povos têm ganhado uma projeção maior, na arte, na política, nas redes sociais. Temos dominado tecnologias, somos muito rápidos no aprendizado. Temos que nos apropriar dessas ferramentas que usaram pra estuprar nossa cultura. A gente tem que se apropriar pra estar no meio. Esse projeto é muito importante porque tem o poder de educar, com grande alcance pela TV aberta.


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