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Comunicação & Problemas

19 de julho, 2021

Não bastassem Cpi, doença do presidente…, tem apagão à vista   Terra arrasada Pois é. Bolsonaro passa boiadas incendiárias sobre a floresta, sabota a cultura […]

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Não bastassem Cpi, doença do presidente…, tem apagão à vista

 

Terra arrasada

Pois é. Bolsonaro passa boiadas incendiárias sobre a floresta, sabota a cultura e as artes, investe contra a universidade, demais educação, ciência e seu comportamento na gestão da pandemia revela decidida aposta na morte.

O que esperar diante desta política de terra arrasada?

No mínimo, que mais pessoas e até instituições sintam-se livres para perpetrar absurdos análogos – estão na moda…

Tal há de ser o caso dos trêfegos deputados do centrão, sob o beneplácito da maioria dos demais (em quase todos os partidos!), que decidiram numa penada simplesmente triplicar a verba do Fundo Eleitoral.

Verba pra enganar

Os recursos que suas excelências usaram nas campanhas anteriores já configuravam uma afronta à pobreza que vitima a maioria do povo: oscilaram pouco abaixo de R$ 2 bilhões nas duas mais recentes eleições.

Pois no ano próximo os deputados acham razoável gastar R$ 5,7 bilhões de um Tesouro sabidamente combalido, tanto que só a fórceps (quer dizer, a mando do Stf) arranjou dinheiro para o censo demográfico (que já atrasou dois anos) e libera a conta-gotas recursos com que atender às emergências dos mais pobres durante a pandemia.

Mas para enganar o eleitor com um marketing tão poderoso quando mentiroso não vai faltar verba.

Fraqueza

No início da semana ora finda os sinais de doença já estavam na cara, literalmente: além dos soluços, Bolsonaro tinha a face congestionada e exibia inchaços, protuberâncias, fundas olheiras.

Não, não torço por que morra o projeto de tiranete que não hesitou em deixar morrer centenas de milhares de brasileiros. Modera-me a aversão a solidariedade à família; se não aos filhos que lhe realimentam a rudeza, moldados a sua imagem e semelhança, talvez à atual mulher cuja infelicidade maior será aceitar o machismo aparente na relação e certamente à filha de dez, onze anos que tem culpa nenhuma de quem a gerou e despreza-lhe a condição feminina:

“Fraquejei”, disse o pai desnaturado ao ‘explicar’ por que nasceu mulher.

Manobra canhestra

Internado o presidente, família e aliados insistem na insensibilidade (até ante a saúde do capo!) e usam politicamente o episódio. Os mais próximos, filhos à frente, não perdem chance de atribuir ao Pt a facada em 2018 da qual resultaria a fragilização do ex-atleta militar cujo apelido na Academia era “Cavalão”.

Há quem sugira a intenção de deixar o presidente da Câmara no Planalto por um tempo, a agir confortavelmente no centrão a que pertence para defender Bolsonaro e acelerar as próprias pautas tão ou mais retrógradas quanto as do titular.

A ser verdade, a manobra é natimorta: o vice Mourão terá retornado do exterior neste sábado e Artur Lira, réu em dois processos no Stf, não pode substituir o presidente.

Alarmes no centrão

Motivos de preocupação não faltam ao presidente e sua turma. A Cpi da pandemia segue a descobrir escândalos em rápida sequência e cada vez mais perto da famiglia, enquanto se notam sinais de alarme no centrão que hoje lhe dá suporte parlamentar.

Quinta-feira o líder do governo, experiente e articulado senador, declarou-se primeiro “desconfortável” e em seguida, mais sinceramente, “constrangido” pelo acontecido no Ministério da Saúde sob o general Pazuelo.

O qual, por sua vez, no dia seguinte foi apanhado em mais mentira: dissera ao relator da Cpi, afrontando-o com arrogância, que como ministro não negociava com empresas… e foi desmentido por vídeo que o mostram a interagir com empresários e anunciar compra de vacinas via pretensos intermediários.

Desconforto, constrangimento

Desgraça pouco á bobagem e outro personagem destacado do centrão, líder do governo na Câmara dos Deputados, também parece desconfortável e-ou constrangido ao ter sido citado por Bolsonaro como possível autor de falcatruas. Ricardo Barros quer porque quer depor na Cpi, até apelou ao Stf para que mande convocá-lo.

A depender da habilidade dos inquiridores (e os há bons, na Comissão) sabe-se lá o que poderá delatar, mesmo não querendo. A ver no que dá… e enquanto a gente espera o que dará vale examinar mais de perto outra frente problemática em que o governo não sabe como agir.

Calças curtas

A crise anunciada pra daqui a pouco na oferta de energia elétrica resulta diretamente da irregularidade das chuvas e indireta, mas preponderantemente de erros graves de planejamento.

Desta vez só parte da culpa atribui-se a Bolsonaro e seu péssimo governo, a imprevidência vem de longe e nada (ou muito pouco) aprendemos com anterior e drástica falta d’água nos reservatórios das hidrelétricas, em 2001, que gerou a ameaça de ‘apagões’ frequentes enfrentada por competente racionamento.

Se há vinte anos fomos pegos de calças curtas hoje constata-se que a bainha do short desceu uns centímetros, no entanto insuficientes para encobrir o joelho.

Limites ignorados

A complexa, crítica articulação entre a coxa e a perna, submetida a flexões, torções, pressões previstas e imprevistas vezes sem conta por dia enquanto suporta todo o corpo acima, é metáfora adequada às intricadas intra e inter-relações do subsetor elétrico, em seu próprio âmbito e com o macrossistema social.

Ao lado e intimamente relacionado aos demais setores da infraestrura econômica – transportes, comunicações – o setor energético brasileiro construiu-se arduamente ao longo do século xx, conformou com eficácia invejável matriz de geração elétrica fundada no aproveitamento do potencial hídrico mas falhou num aspecto hoje decisivo: desconsiderou os limites que a natureza impõe ao uso deste potencial.

Impressão de fartura

Não se cobre dos formuladores de então essa falha, se o subsetor foi aqui engendrado num tempo em que as questões ambientais mal afloravam nas preocupações das pessoas, inclusive políticos e até cientistas empenhados em fazer crescer a economia e ainda incientes de quanto as atividades produtivas dependem da higidez ambiental – o primeiro alerta data de 1972, quando se realizou em Estocolmo a inaugural conferência mundial sobre meio ambiente.

No Brasil os recursos hídricos pareciam inesgotáveis e predominava a ideia de que aumentos de demanda seriam prontamente atendidos por obras de captação, tanto faz se para o consumo humano ou animal, agricultura, indústria… e geração de energia.

Correção errada

O compulsório, custoso racionamento de 2001 – que imprensa erra quase unanimemente ao chamar ‘apagão’ quando na verdade o evitou – ensinou-nos algumas coisas, a principal delas que é imprudente depender tão radicalmente de uma única modalidade.

Com efeito, na virada do milênio a dependência da geração hidrelétrica no Brasil andava pelos 80% (hoje oscila entre 60% e 70%). Houve sem dúvida um avanço, mas na correção de um erro incidimos em outro ao centrar esforços na construção de termoelétricas para superar o desequilíbrio.

Erros mitigados

Menos mal que tenhamos apostado mais no menor dos erros possíveis, ao preferir usinas térmicas cujos combustíveis são principalmente o gás natural, avançar no uso de rejeitos de atividades produtivas como o bagaço da cana na agroindústria sucroalcooleira e até, embora incipientemente, aproveitamentos do lixo e outros detritos sobretudo urbanos – inclusive humanos, nas estações de tratamento de esgoto.

Também frequentam essa diversificação as gerações eólica (um sucesso!, partiu de pouco mais que zero nos albores deste século para mais de 10% atualmente) e solar, em rápida progressão porém dependente da solução de conflitos na distribuição, que lhe permitam participar com mais que os 3% já atingidos.

Reciclagem urgente

Há entretanto velhos entulhos a remover. Ainda funcionam termoelétricas movidas a diesel e, pior, a óleo dito ‘combustível’, este um infame excremento do refino de petróleo cuja ação poluidora só se compara à do carvão mineral.

Tudo isso sobrevive graças a renitentes lobbies de cartórios empresariais que se associam a corporações de trabalhadores, ambos a ver nem um palmo adiante dos narizes em questões ambientais, e precisa erradicar-se urgentemente.

Lamento a sorte das empresas extratoras de carvão e xisto do sul do Brasil e seus empregados, mas elas veem passar aceleradamente os dias que lhes restam e precisam reciclar-se já.

Alienação malfadada

Estávamos nessas contradições e impasses do subsetor elétrico quando sobre ele e a nação desabou, fruto do insensível liberalismo econômico que Bolsonaro reintroduziu pelas mãos do ministro Paulo Guedes, bem sucedido ator da porção parasitária do sistema financeiro e integrante de um, digamos, ‘segundo time’ das hostes macroeconômicas, a malfadada privatização da Eletrobrás, perniciosa mesmo travestida de capitalização via compra de ações por particulares, a retirar do estado o controle de uma de suas mais benfeitoras empresas.

(Sim!…, leitor apressado, isso é outra história; já a abordei aqui e a ela retornarei, tenha certeza.)

Garantia de injustiça

Volto pois à ‘vaca fria’ da expressão popular, aliás à ‘gelada’ em que nos colocaram os parlamentares com suas emendas populistas ao projeto, feito lei, de alienação da Eletrobrás.

Sob a égide do centrão imediatista inseriu-se no processo um ‘jaboti’ gigante, um gigantesco jaboti de R$ 20 bilhões: a obrigatoriedade de implantar número ainda não especificado de termoelétricas a gás em todo o país, inclusive onde não há oferta local deste combustível nem infraestrura para transportá-lo.

Tal custo será repassado aos consumidores, não importa se empresariais ou individuais, pobres ou ricos: sob controle privado a insensibilidade social estará garantida.

Alternativa melhor

Não ocorreu aos autores do projeto original – Paulo Guedes e sua turma –, nem a dois ou três remanescentes de primeiro time em sua equipe, muito menos aos congressistas que o emendaram e acrescentaram-lhe pencas de ‘jabotis’ a óbvia alternativa, se queriam aproveitar a privatização da Eletrobrás para avançar no equilíbrio da geração: em vez de mais termoelétricas, impulsionar a implantação de unidades eólicas e solares.

Anunciam-se investimentos de R$ 1,6 bilhão para expandir a geração eólica nos próximos quatro anos, o que é ótimo, mas por quê? não desistir das condenadas térmicas e aplicar dez vezes mais no subsegmento?

E há outras alternativas ainda pouco usadas e disponíveis no vasto território brasileiro, inclusive em sua natural extensão oceânica batizada “Amazônia azul” – o nome é um belo achado poético para esse espaço estratégico.

Potência dos ventos…

Faltou imaginação criadora para observar, por exemplo, os ventos constantes, regulares ou periódicos presentes em todo o imenso litoral – alísios do Amapá ao Rio Grande do Norte, a brisa marinha em toda a extensão além de outros, localizados – capazes de sustentar perene movimento dos potentes cataventos geradores, recurso em feliz contraponto às maiores usinas hidroelétricas, quase todas longe do mar.

…sob o Sol onipotente

Além dos ventos somos também abençoados pelo Sol, aliás feitor de todos os ventos e de tudo o mais em nosso sistema planetário.

Na metade de cada um dos 365 dias do ano ele brilha com especial intensidade sobre nossa porção da Terra, a despejar mais energia do que a produzida (aliás, transformada) pelo engenho humano em milênios e logrará produzir até o fim do planeta, consumado seu resfriamento.

Indiretamente aproveitamos, é claro, este potencial ao qual devemos a vida – a dos viventes vegetais e animais – e o mundo mineral que tudo suporta.

Montar pra desmontar?!

Temos muito a evoluir, porém, no aprendizado de seu uso direto como fonte de calor para consumo humano imediato, das prosaicas e utilíssimas modalidades de aquecimento doméstico à já sofisticada e nem tão nova transformação da luz solar em eletricidade, via células fotovoltaicas.

Novos usos a tecnologia prepara e em pouco tempo – o progresso tecnológico salta lustros e décadas velozmente – as termoelétricas aquecidas a combustíveis fósseis serão só isso: fósseis, mastodontes pré-históricos que precisaremos desmontar, com altos custos adicionais ao da extemporânea construção.

 

Tributo a Octavio Malta (Última Hora, Rio, circa 1960)
Marco Antônio Pontes
([email protected] ou [email protected])