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SAÚDE

Estudo brasileiro encontra inseticida DDT em sangue materno e cordão umbilical de recém-nascidos

7 de novembro, 2024 / Por: Agência O Globo

Pesquisa da UFRJ identificou níveis elevados da substância mesmo décadas após ela ter sido banida no país

Estudo brasileiro encontra inseticida DDT em sangue materno e cordão umbilical de recém-nascidos
Pesquisa da UFRJ encontra níveis elevados de DDT em gestantes e recém-nascidos. — Foto: Unsplash

Um estudo de pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) analisou amostras de sangue materno da maternidade-escola da instituição e encontrou níveis detectáveis de DDE, um subproduto do inseticida DDT, em 22% delas. Além disso, identificou a substância em 16% de amostras de cordão umbilical, embora o inseticida tenha sido banido no Brasil ainda no final do século passado.

O trabalho, publicado na revista científica International Journal of Environmental Research Public Health, foi conduzido por membros do Projeto Infância e Poluentes Ambientais (Pipa) da UFRJ e recebeu apoio financeiro da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e do Ministério da Saúde.

Ao todo, foram analisadas 139 amostras de sangue materno e 116 de sangue do cordão umbilical. Os pesquisadores também avaliaram 40 amostras de leite materno no 1º mês após o parto; 47 no 3º mês e 45 de seis meses depois do nascimento. Eles também encontraram o DDT no leite, mas em níveis menos significativos.

O autor do estudo Armando Meyer, professor do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da UFRJ, explica que o DDT é uma substância química muito estável no ambiente e no organismo, por isso ainda há subprodutos dele circulando tanto tempo após terem sido proibidos. Porém, a nova pesquisa traz pontos de alerta, especialmente em relação ao público analisado, acrescenta:

— Nós interagimos com esses subprodutos quando bebemos água, ingerimos alimentos. Mas nessa população específica, há surpresas, porque são mulheres mais jovens, e o DDT começou a deixar de ser usado no Brasil há 30 anos. Muitas nem eram vivas, então esperávamos proporções menores. Outro aspecto que surpreende e preocupa é que estamos falando de gestantes e do cordão umbilical, então isso significa que os fetos estão entrando em contato com a substância na gestação.

Os níveis mais elevados de DDT foram encontrados principalmente entre mulheres que tinham um índice de massa corporal (IMC) antes da gestação acima ou igual a 30, ou seja, que tinham obesidade. Também foram mais altos entre mulheres não brancas e com mais de 40 anos.

Já entre os recém-nascidos, aqueles com pontuação de Apgar igual ou inferior a 8 no quinto minuto de vida também apresentaram níveis significativamente mais altos do inseticida no sangue do cordão umbilical. O teste, utilizado em todo o mundo, é um resultado de fatores como força muscular, frequência de batimentos cardíacos, reflexo, respiração e cor. Quanto maior a nota, melhor.

— O DDT é uma molécula bem estudada. Especificamente na saúde materno-infantil, pesquisas apontam maior risco de nascimento prematuro, de baixo peso ao nascer, de obesidade na adolescência — diz Meyer.

O diclorodifeniltricloroetano (DDT) é uma substância sintética antiga que teve o potencial pesticida descoberto por volta dos anos 40. A partir de 1950, começou a ser utilizado em larga escala, especialmente em campanhas que buscavam erradicar o mosquito transmissor da malária e na agricultura para combater pragas.

Com o tempo, porém, estudos descobriram que o DDT provoca uma contaminação ambiental tanto pela inalação direta, como pelo consumo de alimentos expostos à substância. Já na década de 70, o inseticida começou a ser banido em diversos países. O veto na agricultura se tornou mundial após a Convenção de Estocolmo de 2001 sobre Poluentes Orgânicos Persistentes.

No Brasil, foi proibido na produção agrícola em 1985 e de campanhas sanitárias em 1998. Em 2009, o país sancionou uma lei mais abrangente, em que baniu de vez a fabricação, a importação, a exportação, a manutenção em estoque, a comercialização e o uso do DDT em território nacional.

— O DDT é classificado pela Agência Internacional para Pesquisa em Câncer da OMS no grupo 2A, que engloba substâncias consideradas provavelmente cancerígenas. Publicamos um estudo há pouco tempo que mostrou que indivíduos com maiores níveis de DDT no organismo têm mais chance de reportar um diagnóstico de diabetes. E ele é uma substância neurotóxica, tem uma ação sobre o sistema nervoso. Alguns artigos apontam efeitos na cognição, outros em doenças neurológicas — continua o professor da UFRJ.

Os pesquisadores defendem que, devido aos efeitos nocivos dos poluentes ambientais como o DDT na reprodução e no desenvolvimento humano, a exposição a esses químicos sejam alvo de maior investigação, com amostras maiores da população. Seu impacto sobre o desenvolvimento fetal e infantil até os quatro anos de vida é o foco do Pipa, projeto da UFRJ coordenado pela professora Carmen Froes Asmus.

— Esse estudo foi um piloto, em que usamos uma população menor para ajustar parâmetros. Mas temos um trabalho maior em curso, que engloba 950 mulheres e acompanha 836 crianças, filhos dessas mulheres, já há três anos com uma equipe multiprofissional de médicos, nutricionistas, dentistas, psicólogos. Vamos ter resultados mais robustos. Queremos saber os efeitos sobre o desenvolvimento fetal e o infantil nos primeiros anos de vida. Preliminarmente, podemos dizer que o percentual de detecção de DDT nas gestantes nessa amostra maior está em linha com o encontrado no trabalho piloto — afirma Meyer.


BS20241107174514.1 – https://oglobo.globo.com/saude/noticia/2024/11/07/estudo-brasileiro-encontra-inseticida-ddt-em-sangue-materno-e-cordao-umbilical-de-recem-nascidos-entenda.ghtml