VARIEDADES
Indicado ao Oscar e vencedor do Emmy, diretor carioca radicado nos EUA lança dois filmes no Festival do Rio
11 de outubro, 2024 / Por: Agência O GloboPedro Kos apresenta doc que relaciona boicotes da Casa Branca à crise climática e longa de terror found footage
Formado na tradicional universidade americana de Yale. Vencedor do Emmy. Indicado ao Oscar. Carioca. Este é Pedro Kos, brasileiro de 46 anos radicado nos Estados Unidos que construiu uma trajetória como montador e documentarista e, agora, volta à terra natal para apresentar dois filmes no Festival do Rio: “O efeito Casa Branca”, que tem première de gala, com a presença do realizador, nesta sexta (11) no Estação Net Rio, em Botafogo; e “No nosso sangue”, terror estrelado por Brittany O’Grady e Bianca Comparato também com sessões no evento, no sábado (12) no Cinesystem Praia de Botafogo e, na programação estendida, segunda-feira (14)o Estação Net Gávea.
— Estou vivendo um sonho. Mesmo estando nos Estados Unidos há tanto tempo (desde os 12 anos), ainda tenho uma relação muito próxima com o Rio. Venho muito, toda minha família está aqui. Ter dois filmes no Festival do Rio é surreal, tem sido muito especial estar aqui — diz Kos.
Estreia de Pedro Kos no cinema de ficção, “No nosso sangue” é um terror found footage (expressão designada para filmes cujas imagens simulam registros documentais feitos por personagens em cena) sobre uma documentarista, vivida por O’Grandy (de “The White Lotus”), que decide registrar o reencontro com a mãe que não vê há décadas. Numa jornada pelo interior dos EUA, ela, ao lado de seu cinegrafista, se vê em meio a uma trama de desaparecimentos repleta de mistérios.
Fã do cinema de terror e de exemplares de found footage como “A bruxa de Blair” (1999) e “REC” (2007), o diretor teve receios ao embarcar num filme de gênero em sua primeira experiência na ficção, mas foi perdendo o medo ao perceber que poderia usar muito de seu estilo e suas temáticas como documentarista. Tema de “Onde eu moro”, que lhe rendeu uma indicação ao Oscar de melhor curta de documentário, em 2022, a população de rua dos EUA também está presente em “No nosso sangue”.
— Abordei o filme como um documentário, com as mesmas pesquisas e processos. Passei um bom tempo em Las Cruces, no Novo México, conversando com as pessoas e instituições. Estamos vivendo num mundo em que desumanizamos tanto as pessoas, e não queria fazer um filme de gênero como muitos, em que as vítimas são invisíveis — aponta.
Ainda dentro do espírito documental, o diretor lembra do trabalho como montador do making of de “O novo mundo” (2005), de Terrence Malick. Kos destaca que se inspirou no estilo do cineasta de “soltar seus atores no mundo”, deixando-os livres para criar.
— Pedro confia muito no improviso e na expressão própria de cada ator — reforça Bianca Comparato. — Apesar de saber exatamente o que quer, talvez pela sua experiência como editor, e de passar as direções de forma clara, ele sempre salvava o último take para que os atores fizessem o que quisessem. Era o que chamávamos de fuck it take (algo como “tomada foda-se”, em tradução livre), e muitas dessas tomadas foram aproveitadas no corte final.
Codirigido em parceria com Jon Shenk e Bonni Cohen, com quem Kos trabalhou em “Onde eu moro”, o documentário “O efeito Casa Branca” usa imagens de arquivo para retratar um importante momento, no final dos anos 1980 e início dos 1990, em que a discussão sobre o impacto do homem no meio ambiente teve como ponto mais alto a conferência das Nações Unidas Eco 92, realizada no Rio. O diretor lamenta que os planos e acordos mais ambiciosos de defesa ambiental tenham sido, à época, enfraquecidos e frustrados pela atuação política dos Estados Unidos, o que muitos apontam como causa de um momento atual em que o planeta passa por muitas situações anunciadas por cientistas 32 anos atrás.
— Tivemos a oportunidade de começar a tentar resolver. E foi uma oportunidade perdida. Vivemos hoje as consequências de tudo que advertiam em 1992. A crise climática não é mais o futuro, é o presente, e é uma tragédia anunciada. Temos extremas secas no Centro-Oeste, enchentes históricas no Rio Grande do Sul, furacões poderosos nos EUA, estamos vivendo tudo que os cientistas previam — diz Kos.
Para gringo ver
Com olhar atento a questões sociais e políticas, o diretor lembra a experiência como montador de “Lixo extraordinário” (2010) como um “divisor de águas” em sua vida. Indicado ao Oscar de melhor documentário, o longa codirigido por Lucy Walker, João Jardim e Karen Harley visita o aterro sanitário de Jardim Gramacho para registrar projeto artístico de Vik Muniz, que produz retratos dos catadores de lixo a partir de objetos colhidos no local.
— O Pedro é uma pessoa incrível e um dos responsáveis por “Lixo extraordinário” ter tido o resultado que teve. Ele montou o filme em Los Angeles ao lado da Lucy Walker, que não falava português, então foi quem conseguiu dar ao filme uma brasilidade — elogia João Jardim. — Como mora nos Estados Unidos há muito tempo, ele entende como criar uma narrativa sobre o universo brasileiro que os gringos comprem. Tínhamos que traduzir o que acontecia em Gramacho para um público internacional, e o Pedro foi o responsável por isso.
No momento, além de se dedicar à divulgação dos dois filmes presentes no Festival do Rio, Kos trabalha no desenvolvimento de dois documentários nos Estados Unidos. Ele também já iniciou conversas para fazer filmes no Brasil, em especial de ficção, um desejo antigo do realizador que não quer saber de deixar o Rio para trás.
— Sou 100% carioca e trago o Brasil em tudo na minha vida, na forma como vejo o mundo e me relaciono com as pessoas — diz o diretor. — Por mais que more em Los Angeles há muitos anos, quando ligo para minha família avisando que virei ao Brasil, eu digo: “estou indo para casa”.