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VARIEDADES

Livro sobre Dona Vitória, que filmou rotina do tráfico no Rio, ganha nova edição com desdobramentos e identidade dela revelada

10 de setembro, 2024 / Por: Agência O Globo

MP da Bahia pediu que morte da idosa fosse investigada; história inspirou o filme ‘Vitória’, protagonizado por Fernanda Montenegro

Livro sobre Dona Vitória, que filmou rotina do tráfico no Rio, ganha nova edição com desdobramentos e identidade dela revelada
Joana da Paz foi chamada de 'Dona Vitória' após entregar nas mãos da Polícia Civil fitas de vídeo com as imagens que levaram para a cadeia 34 criminosos — Foto: Fábio Gusmão | Divulgação

Em março de 2023, o Ministério Público da Bahia instaurou um procedimento para investigar a morte de Joana Zeferino da Paz, após ela sofrer um acidente vascular encefálico (AVE), aos 97 anos, que a deixou dez dias internada. A idosa, que ficou conhecida como Dona Vitória por questões de segurança, teve sua história revelada pelo EXTRA em 2005, com repercussão até fora do Brasil. Ela filmava a rotina do tráfico no Rio de Janeiro da janela de sua casa. Apesar do pedido da promotoria, no entanto, a apuração não evoluiu e o registro foi arquivado. O atestado de óbito dela indica morte por “traumatismo cranioencefálico, instrumento contundente, queda”. E esse é apenas um dos atuais desdobramentos presentes na nova edição do livro que conta a história dela, escrito pelo jornalista e editor executivo do EXTRA Fábio Gusmão.

— Eu tive que revistar muita coisa, principalmente a situação dos policiais (que foram acusados de envolvimento com a quadrilha de traficantes) e atualizo isso. Os traficantes a gente sabe quando um ou outro sai e volta a ser preso, mas eles viram coadjuvantes nessa história. A parte da investigação da morte dela era natural acompanhar. É importante também ficar em cima para as pessoas saberem que tem alguém sempre olhando.

Neste ano, a promotora responsável pelo pedido, Isabel Adelaide de Andrade Moura, oficiou a promotoria do Idoso de Salvador recomendando que as investigações continuassem. Além dessa atualização, a nova edição do livro traz, 18 anos depois da publicação da primeira, mais fotos das filmagens que Joana fez, depoimentos, e como ficou a relação dela com o jornalista após todos esses anos.

— Para mim, toda a história tem um significado muito maior do que uma matéria jornalística. Se trata de encontro mesmo. Revisitar também traz a possibilidade de aprofundar determinadas situações. Foi ótimo, mas também com muitos momentos difíceis — diz Gusmão, relembrando também a ocasião em que a história foi publicada: — Quando acabou, eu não sabia se ia encontrar com ela de novo. Eu dou o ponto final e começo a chorar. Para mim, na verdade, era um ponto de interrogação. Fico até emocionado de lembrar.

O relançamento do livro (R$ 69,90) será dia 29 de outubro, na Travessa de Ipanema; e dia 12 de novembro, na Travessa de Pinheiros. A capa ganhou uma repaginada importante e passou a ter agora o nome verdadeiro de Dona Vitória, que por muitos anos precisou ser ocultado por segurança.

— A história só foi contada sabendo que ela estava em segurança. Mas ela era muito ansiosa e eu entendo. É muito difícil você fazer um movimento tão grande como esse, e as pessoas não poderem saber quem você é. Na verdade, ela perde a identidade dela e ganha novas, tanto a do jornal, como Vitória, quanto no Programa de Proteção. Imagina isso para uma pessoa de 80 anos — conta o autor do livro.

A ideia de fazer um relançamento da obra, que agora se chama “Dona Vitória Joana da Paz”, veio quando a história passou a ser filmada para os cinemas. O jornalista explica:

— Pensei que seria uma boa relançar, atualizar algumas coisas. Só que eu não esperava a morte dela. Quando isso acontece, o relançamento vira até uma homenagem muito significativa, tem um propósito ainda maior. E acho que essa história finaliza com o filme, fica eternizada. Sei que ela acreditava que a vida continua, mas de uma outra forma, então acredito que fique feliz.

História de filme

Em breve, a trajetória da corajosa idosa será contada no filme “Vitória” nos cinemas, protagonizada por Fernanda Montenegro — uma grande vontade de Joana. O longa marca ainda o último trabalho do diretor Breno Silveira, que morreu após um ataque cardíaco durante as filmagens, em 2022. Foi ele quem idealizou o longa, em parceria com a roteirista Paula Fiuza, sua esposa.

— O Breno me contou que se apaixonou pela história. Se não fosse essa paixão dele, talvez ela não fosse para as telas — diz Gusmão, que já assistiu o filme, ao lado de Fernanda e do ator Alan Rocha, que o interpreta na trama: — Por mais que seja uma ficção, você vê a essência dela. Eu acho que Dona Joana ficaria feliz com o resultado do filme. Ela ficou toda orgulhosa quando soube que seria representada por Fernanda Montenegro.

Amigo pessoal e parceiro do cineasta na Conspiração Filmes, Andrucha Waddington assumiu a missão de finalizar o projeto, que é o primeiro longa Original Globoplay com lançamento nos cinemas, sob distribuição da Sony Pictures.

Aprendizados do livro

“Tem várias sacadas que para quem gosta de jornalismo (vai encontrar)… Também tem a ver com ética e outros ensinamentos. E tudo começa em um dia rotineiro de trabalho. A gente acha que para fazer algo grandioso precisa ter um esforço hercúleo. Mas, às vezes, é só você abrir o olhar. Tem a ver com coragem, tem a perseverança de uma mulher guerreira, as dificuldades que uma mulher sofre, os abusos e mesmo assim ela sempre tendo força para superação. E quando escrevo de forma testemunhal é para também ter um pouco ali do meu ponto de vista”, aponta o autor.

Morte de Dona Joana

“Quando eu soube da morte dela foi um baque. Você nem imagina, porque a pessoa acaba se tornando imortal. E aí tive uma preocupação de como eu apresentaria essa mulher, como deveria ser o nascimento da dona Joana. Agora a gente usa o nome verdadeiro e uma outra foto feita por mim que mostra o rosto dela na capa”, diz o jornalista.

Vista da janela

“Quando ela morreu, o rapaz que estava morando com ela, que a considerava uma mãe, me mandou uma filmagem e disse: “Olha a vista dela”. Você via que era um lugar humilde (onde estava morando), mas que tinha vista para o mar em Salvador. Então da janela para o para o crime, foi para a janela para o mar”, finaliza Gusmão.


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