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CULTURA

Pedro Miranda se ‘afasta’ do samba e lança ‘disco de esperança’ com músicas de Chico e Caetano e canções argentinas

17 de abril, 2024 / Por: Agência O Globo

Expoente da geração Lapa lança ‘Atlântica senhora’, seu quinto álbum, em que também mostra seu lado compositor

Pedro Miranda se ‘afasta’ do samba e lança ‘disco de esperança’ com músicas de Chico e Caetano e canções argentinas
Pedro Miranda lança o álbum “Atlântica senhora” — Foto: Divulgação

Pedro Miranda é um expoente da Geração Lapa, aquela que, no final dos anos 1990 e ao longo dos 2000, revitalizou o bairro do Centro carioca cantando sambas alheios, sobretudo de gente nascida décadas antes. Com “Atlântica senhora”, seu quinto álbum, ele pretende se afastar mais da primeira parte dos seus 26 anos de carreira.

— É um disco mais plural. Tudo faz parte de mim. Comecei a achar que era um personagem: o menino da Zona Sul que se encantou pelo samba. Um sambista sem ser — afirma. — Agora me sinto mais à vontade de apresentar quem eu sou mesmo: um cara da Zona Sul que gosta de samba, que venera o samba, mas que também gosta de Caetano, Chico, músicas em espanhol…

‘Vou pelo que me toca’

Ele diz que não viu problema em gravar “Futuros amantes”, de Chico Buarque, embora seja uma canção bastante conhecida. A escolha se deu pelo tanto que ela o emociona.

— No início da Lapa tinha aquele fascínio pelo samba raro, inédito, do baú, aquela música do Nelson Cavaquinho que ele não gravou e alguém descobriu. Havia essa falsa ideia de que o desconhecido é que era o bom. Eu dizia: “Gente, o ‘Chega de saudade’, o ‘Diz que fui por aí’, o ‘Futuros amantes’ são músicas famosas por mérito delas.” Vou pelo que me toca, mas busco um arranjo diferente.

Para interpretar “Nada de novo”, um samba conhecido de Paulinho da Viola, ele pediu ao diretor musical Luís Filipe de Lima algo que não lembrasse muito as marcas do gênero. Na maior parte da faixa, os instrumentos são piano, repique de mão e flauta-baixo.

— Esse disco marca um caminho do Pedrinho em direção à MPB — assinala Luís Filipe. — Ele foi muito envolvido com o samba, chegou a tocar com veteranos, mas agora quer um caminho que não seja óbvio, que não siga os cânones do samba tradicional.

Produção custeada pelo próprio artista — com distribuição da Biscoito Fino —, o álbum é o segundo em que ele, mais reconhecido como intérprete, expõe seu lado compositor. Em “Da Gávea para o mundo” (2021), foram sete músicas suas entre as dez. Em “Atlântica senhora”, são seis faixas entre 14.

— Há alguns anos, comecei a sentir vontade de deixar alguma coisa minha no mundo — conta Pedro, de 47 anos e três filhos. — Eu tinha muito medo. Cantava sambas de Paulinho, Chico, Elton Medeiros e ficava imaginando o que poderia fazer. Depois fui percebendo que a nossa criação é única. Independentemente de ser bom ou ruim, aquilo só você pode criar. O que a gente faz é sempre original.

A faixa-título, parceria com Cristovão Bastos, traz um elemento que aparece em outros pontos do disco: a natureza. Não surpreende, já que muita coisa foi criada sob influência do que Pedro fez entre setembro de 2021 e dezembro de 2023: apresentações de voz e violão — e ele ainda era um violonista iniciante — aos domingos, no Parque da Cidade, na Gávea, bairro da Zona Sul carioca.

— Na primeira vez, achei que, se aparecessem 30 pessoas, seria maravilhoso. Apareceram 400. Deu um nó no trânsito da Gávea — recorda. — O que fica da experiência no parque é esse disco.

Pedro é um agitador cultural do bairro da Zona Sul onde vive. Em 2017, uniu-se a amigos como Alfredo Del-Penho, João Cavalcanti e Moyseis Marques para realizar o Samba na Gávea, todas as segundas, num restaurante do bairro. Depois, criou o Forró da Gávea, inicialmente às quartas — e que já esteve em mais de um lugar. E levou para a Praça Santos Dumont o Choro na Rua.

Arnaldo Antunes no time

A turma do forró está com ele no xote “Era Marte?”, parceria com Marcos Sacramento. “Plural”, como ele classifica, o disco também tem duas músicas argentinas, fruto de seu interesse pelo país onde nasceu sua avó paterna: “Candombe bailador” e “Oración del remanso”.

No time de parceiros ainda há Domenico Lancellotti (“Tanto pra sonhar”), Chacal (“Capivara do Brasil”), Zé Paulo Becker (“Deixa lavar”) e Zé Renato (“Pois Zé”). E há outro samba (“Também pede bis”, de Cézar Mendes e Arnaldo Antunes). Em comum no repertório, uma sensação de renascimento.

— Durante a pandemia, eu pensei: “O que eu vou fazer? Acho que nem vou mais ser músico.” O parque foi me dando muita força pra continuar. É um disco de esperança — ressalta ele, que vê um sentido político em gravar “Flor do cerrado”, de Caetano Veloso, após as eleições presidenciais de 2022. — É como se viessem novos ares de Brasília, uma fanfarra vindo do meio do Brasil e espalhando uma nova onda.

Surpresa no início e no final do novo disco é Cátia do Acarajé, que canta um ponto para o orixá Oxóssi, “Filha de caboclo”. Representa mais uma herança dos domingos no Parque da Cidade, onde ele a conheceu.


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