
VIVER A VIDA
A vida de Ana Loureiro já é uma festa, mas, no dia em que ela troca de idade, se transforma numa espécie de evento oficial no Lago Sul, onde reside.
– Sim, está louco. – Desculpe, não entendi. – Louco. Absolutamente louco. – Louca é você Começou bem assim a semana de Daniela. Ela no carro, digitando a mensagem rapidinho, enquanto o próximo passageiro já entrava dizendo que, “por favor, desligue o ar-condicionado”. Andava mesmo louca para finalmente vender o apartamento que vai herdar da …
– Sim, está louco.
– Desculpe, não entendi.
– Louco. Absolutamente louco.
– Louca é você
Começou bem assim a semana de Daniela. Ela no carro, digitando a mensagem rapidinho, enquanto o próximo passageiro já entrava dizendo que, “por favor, desligue o ar-condicionado”. Andava mesmo louca para finalmente vender o apartamento que vai herdar da mãe e que vem lhe rendendo – ao contrário – um condomínio caríssimo para pagar todo mês. Sempre odiou o apartamento gigante que parecia cair aos pedaços desde o dia em que foi comprado. E olha que foi comprado quando ela era ainda menina. A mãe dizia que ia lhe trazer muito dinheiro. “Quando eu morrer, essa belezinha aqui vai ser o seu salário”. Como se ela não fosse capaz de trabalhar e ganhar por si um salário. Mudou-se no dia em que a mãe adoeceu. “Quando eu morrer”. Estava em coma há dez anos. Dez anos, na tentativa de alugar o elefante branco, o elefante na sala, no bairro…
O danado dividia muro com uma escola enorme e barulhenta. Sempre – e esse sempre era raríssimo – que a visita de um possível locatário era marcada, acabava se dando exatamente na hora do recreio dos pequenos. E aí que o interessado não passava nem da sala. “Nossa, parece que eles estão aqui dentro, não?”, sim, parecia. Ela morou ali uma vida inteira e também aprendeu a odiar o intervalo da tarde. Estudava de manhã, do outro lado da cidade. A escola era cara e manter o apartamento era mais do que caro, “os olhos da cara”, lembrava a mãe a cada fim de ano quando ela pedia para mudar para a vizinha onde estudavam quase todos os amiguinhos do prédio.
E era mesmo. Embora manter não fosse o verbo favorito da mãe. Lili, a shih tzu da família, rasgou as cortinas da sala no aniversário de oito anos de Dani, pois que na foto do dos quinze, a cortina seguia igual. Aconteceu assim com cada vazamentinho, cada descascado de parede, cada azulejo rachado. Deus me livre. E aí que, domingo, ela decidiu dispensar todas as imobiliárias e fazer uma placa, quanto maior, melhor, que dizia: “Apartamento livre no sétimo andar. Venha morar sem aluguel, pagando o condomínio, é só chegar. Direto com o proprietário”. Pendurou hoje mesmo e se prometeu que entregaria as chaves ao primeiro que entrasse em contato.
Direto com o proprietário. Teria resolvido agorinha se o corretor do telefone não teimasse em trocar tudo o que ela fala. Está livre, deveria ter dito. Livre. Corretores e sua reserva de mercado. Vai rolar Dani, calma. Boa semana queridos.
Roberta D’Albuquerque é psicanalista, autora de Quemmandaaquisoueu – Verdadesinconfessàveissobre a maternidade e criadora do portal A Verdade é Que…
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A vida de Ana Loureiro já é uma festa, mas, no dia em que ela troca de idade, se transforma numa espécie de evento oficial no Lago Sul, onde reside.
Você tá colhendo tudo que plantou com trabalho, empatia e respeito. Uma pessoa de verdade, de coração puro.
A Abrasel-DF divulgou que, durante a semana do Dia dos Pais, os bares e restaurantes do DF esperam um crescimento de até 15% no faturamento.
Roberta D’Albuquerque é psicanalista, autora de Quem manda aqui sou eu – Verdades inconfessáveis sobre a maternidade e criadora do portal A Verdade é Que…