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Ruim. Jura?
23 de setembro, 2024Roberta D’Albuquerque é psicanalista, autora de Quem manda aqui sou eu – Verdades inconfessáveis sobre a maternidade e criadora do portal A Verdade é Que…
Cometi um erro grave. Estou às voltas com ele desde abril. Assumo a minha responsabilidade por mais difícil que seja assumir. Me envergonha um pouco o erro. Era evitável. Era previsível inclusive o resultado desastroso.
Comprei um desses sofás da internet. Sem experimentar, sem nunca ter visto, sem medir a sala, sem entrar no Reclame Aqui antes de apertar o “concluir a compra”. Totalmente iludida pelos videozinhos bem feitos que me apareciam no Instagram. O primeiro erro não foi nem a compra, sabe? Foi assistir o vídeo até o final. É mirim demais. Eu sei que vocês sabem, mas não custa lembrar: entrou um vídeo de um sofá, de um lançamento de apartamento de 20m2, de um teste de Bumbum Cream, é importante que você não assista até o final. É vital que você não clique no “saiba mais”. Assim como os Gremlins (dê um googlezinho se você tem menos de 45 anos), eles se multiplicarão e te atacarão como se não houvesse amanhã e quando menos você esperar, estará na fila da Caixa Econômica Federal tentando financiar um apartamento feio que você não quer morar porque você e suas filhas teriam que dormir em pé, não caberia a sua máquina de lavar nem a sua geladeira – que são pequenas -, nem você tem dinheiro pra comprar apartamento, nunca ouviu falar do bairro que está a 25 estações de metrô da sua casa atual, tem parede de isopor e não presta, claro que não presta.
Pois então. Assisti até o final e toda vez que aparecia de novo eu assistia de novo. Uma coisa tão satisfatória a caixa abrindo o sofá se desmontando, “olha que lindo”, “dá pra dividir em 10x sem juros”, “são vários módulos e possibilidades de montagem”, “gente, como é prático”. Comprei. Mas rapaz, até o apartamento de 20m2 onde o diabo fez a curva merece sofá melhor. O bicho chegou com dois meses de atraso, mais troncho do que conversa de homem desconstruído. Não, mais troncho do que conversa de vendedor de internet. É curto. Você senta com a coluna reta e com metade da bunda pra fora, tão confortável quanto uma cadeira de transporte público de dois lugares, quando ao lado de um homem desconstruído de perna aberta em semiespacate, com a sua cruzada e apertada, enquanto segura no colo 4 bandejas de ovos para ajudar uma pessoa que estava de pé ao seu lado e ao lado de outras 549 pessoas, no vagão mais apertado do metrô às 18h na estação Sé. É leve. Se não tiver um tapete, funciona como um skate com as rodinhas recém-ajustadas com o óleo da melhor qualidade encontrado no mercado e eu nem sei se vai óleo em rodinha de skate. É mole, sem padrão e mal ajambrado, como todos os homens do vagão em semiespacate em cima de skates recém-ajustados. É antigatos, mas ninguém avisou aos meus gatos que existem sofás antigatos.
Pedi pra trocar. Demorou mais dois meses e chegou pior que o primeiro. Os gatos não têm reclamações a fazer. Já arranharam esse tanto quanto o anterior. Pedi pra trocar de novo. Até agora nada. Escrevi no Reclame Aqui. A minha reclamação (marcada como não lida) é a de número 549. A empresa está classificada como “Ruim”. Jura? E é isso. Antes uma bunda flácida sentada confortável em sofá decente do que 10 prestações de Sofá na Caixa e Bumbum Cream na fatura do cartão. Boa semana, queridos.
Roberta D’Albuquerque é psicanalista, autora de Quem manda aqui sou eu – Verdades inconfessáveis sobre a maternidade e criadora do portal A Verdade é Que…
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