Brasília Agora


COLUNAS

Sem vergonha

11 de dezembro, 2023

“Bom dia, Roberta, passando pra discordar de cada linha do seu texto”. Recebi essa mensagem quarta fim da noite. Seguiam 10 parágrafos – 10 parágrafos […]

Sem vergonha

“Bom dia, Roberta, passando pra discordar de cada linha do seu texto”. Recebi essa mensagem quarta fim da noite. Seguiam 10 parágrafos – 10 parágrafos – de discordância. Num primeiro segundo, me deu uma raiva, uma raiva meio física e taquicárdica, sabe? Mas a curiosidade, minha gente, a curiosidade ocupa seu espaço. Se esse cara discorda de cada linha e produziu outras muitas linhas sobre a discordância, prestou uma atenção danada ao que eu digo, não é? Aí os batimentos foram voltando ao ritmo, o desejo de saber dele, do que pensa, do que o fez tomar tempo para me alcançar, para debater foi tomando o lugar da raiva. 

Quarta-feira à noite, eu seguia com o computador ligado a essa hora por uma razão bem particular. Quinta, era aniversário de minha mãe, ela encontraria com meus tios na casa de um deles que também faz aniversário no dia 7. Eu tomando chá e contando pra Lola sobre a festa do dia seguinte, ela solta um “e se a gente mandasse um carro de som pra eles?”. É meio como quem pergunta a um macaco “e se a gente comesse uma banana?”. Me pus a pesquisar, a fazer orçamentos, a pensar nas músicas, a escrever o discurso. No meio dessa agonia, o e-mail, a discordância.

Foi interessante essa meio mussarela, meia calabresa. Eu não tive um pingo de dúvidas sobre o gostar ou não de minha mãe e de meu tio. Tive certeza absoluta de que a música seria “O que é o que é” na voz da Bethânia. Nem me passou pela cabeça que Simone e Simaria têm uma música com o mesmo nome cujo refrão diz “O que é, o que é? Alguém tem um palpite? É chifre, é chifre”. Já pensasse, minha gente? Um carro de som, chamando por minha mãe e meu tio e gritando no meio da rua “é chifre, é chifre”.  

Fechei tudo, fiz o pix e fui dormir. No outro dia, acordei numa dúvida tão grande. Será que vão gostar? Será que estrago a festa com essa surpresa sem noção. Será que minha irmã e meus tios vão me achar uma louca? Será que meu discurso tá ridículo? Talvez tenha sido efeito do e-mail do leitor discordante, ou ainda um pingo de juízo que recaiu sobre mim. Olhe, fiquei numa agonia até a minha mãe me mandar fotos e vídeos do acontecimento. Só pra vocês não se aperrearem aí, deu tudo certo, foi Bethânia quem cantou. Minha mãe agarrou o microfone e fez ela mesma um discurso, dançou com os braços pra cima enquanto cantava “Viver e não ter a vergonha de ser feliz”.

Ao e-mail, respondi também grandão, abriu-se uma conversa. O leitor era ótimo, um sabido, umas ideias boas, outras meio tronchas. Deu pra rir junto e até pra agradecer a provocação. Quase que o macaco aprende a perguntar antes de abrir a boca “é maçã ou prata?”. Boa semana, queridos. É bonita e é bonita!

Roberta D’Albuquerque é psicanalista, autora de Quemmandaaquisoueu – Verdadesinconfessàveissobre a maternidade e criadora do portal A Verdade é Que…

@robertadalbuquerque
[email protected]
https://www.facebook.com/roberta.dalbuquerque
https://www.instagram.com/robertadalbuquerque/