COLUNAS

Três tigres ternos

13 de janeiro, 2025

Roberta D’Albuquerque é psicanalista, autora de Quem manda aqui sou eu – Verdades inconfessáveis sobre a maternidade e criadora do portal A Verdade é Que…

Dos quatro analisando que vi hoje cedo, quatro usaram a palavra ternura. Fazia tanto tempo que eu não escutava essa palavra, chega entrou doce no meu ouvido: ternura. Na verdade é mentira. Um deles usou terno e nem se referia a carinho ou meiguice. Era à roupa que precisou alugar para o casamento da ex e tudo que há, para ele, de pouco afetuoso na ocasião que se aproxima. Ainda assim, três pessoas no mesmo dia. Qual foi a última vez que o leitor encontrou com a oportunidade de dizer ou ouvir de uma ternura?

Digita aí na busca do Whatsapp. Eu digitei. O mais perto que cheguei foi também um terno. Era dia primeiro e eu contava pras minhas filhas que não tinha acertado a Mega da Virada, mas tinha feito um terno. Foi também o mais perto que cheguei dos R$800 milhões (para os quais eu já tinha grandes planos, diga-se).

Às vezes acontece isso na clínica, várias pessoas usando a mesma palavra no mesmo dia, citando a mesma música, usando a mesma cor de camiseta. Eu gosto, presto atenção. Hoje foi ainda mais impressionante porque no fim de semana agora tive uma sensação profunda de ternura. Só agora entendi.

Veio de um desconforto, um aborrecimento mesmo, com uma pessoa querida que ocupa um espaço enorme em minha vida. Fiquei chateada, de verdade, tive um apertinho na garganta, uma vontade danada de chorar. Não foi nada seríssimo não, mas mexeu comigo, me desestabilizou. Dava pra respirar e deixar pra lá (até porque desta pessoa só vem doçura na maior parte do tempo, tanta coisa que compensa), mas resolvi fazer virar palavra, dizer de dentro. Nem sei se “resolvi” é o melhor jeito de explicar. Na verdade, o descontentamento me saiu feito um espirro quase. Sabe quando não dá pra segurar?

Coisa bonita é quando a gente espirra e alguém deseja saúde com uma força que chega a aumentar a imunidade meio no automático, né? Pois que foi bem assim, uma reclamação recebida com ternura.

Dizer da gente é como marcar os seis números de uma Mega da virada. Na análise, claro, mas não só. Para o outro com o outro. E se o outro não te receber com saúde, talvez não seja um outro que mereça a sua ternura. Mas isso ficou de um apaixonamento e de uma autoajuda que quinta série, não foi? Me deixa, vai, é besta, mas é sério. Boa semana, queridos.

Roberta D’Albuquerque é psicanalista, autora de Quem manda aqui sou eu – Verdades inconfessáveis sobre a maternidade e criadora do portal A Verdade é Que…

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