ECONOMIA
Veja como vão se comportar os preços de alimentos e energia, que puxaram a inflação em setembro, nos próximos meses
10 de outubro, 2024 / Por: Agência O GloboAnalistas estimam que IPCA vai superar a meta de 4,5% neste ano
A inflação voltou a acelerar em setembro após deflação (queda média de preços) em agosto. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), divulgado ontem pelo IBGE, subiu para 0,44%, depois de registrar -0,02% em agosto. O resultado foi puxado, sobretudo, pelo aumento de energia elétrica e alimentos. A conta de luz ficou 5,3% mais cara e respondeu por praticamente metade do índice do mês.
O mercado estimava alta de 0,46%, um pouco acima do que o IBGE captou. No ano, a inflação acumula alta 3,31% e, nos últimos 12 meses, 4,42%, bem próximo do teto da meta fixada pelo governo para este ano de 4,5%.
O resultado do IPCA em setembro confirmou o que os economistas esperavam: as condições climáticas adversas estão afetando preços de itens básicos, como energia elétrica e alimentos. Um efeito que deve se manter até o fim do ano e adicionar mais pressão ao orçamento das famílias.
No caso da energia, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou que entrou em vigor a bandeira vermelha patamar 2 este mês, o que encarece ainda mais a conta de luz, que já tinha aumentado em setembro com a adoção da bandeira vermelha patamar 1. Já no caso dos alimentos, a seca tem prejudicado a produção agrícola e os pastos.
Luz cara por mais tempo
Combinados, esses efeitos devem fazer o IPCA estourar o teto da meta de inflação de 4,5%. Especialistas acreditam que a bandeira vermelha patamar 2, em vigor este mês, deve se manter até dezembro. Com os níveis dos reservatórios da região Sudeste/Centro-Oeste em torno de 44%, os próximos meses serão marcados por uma conta de energia mais cara devido ao uso das usinas térmicas, que são acionadas para poupar o volume de água das usinas hidrelétricas.
Para Mayra Guimarães, diretora de Regulação e Mercado da Consultoria Thymos, a expectativa é que a bandeira vermelha patamar 2 se mantenha na conta de luz até dezembro. Segundo ela, o nível dos reservatórios do Sudeste/Centro-Oeste em outubro está menor do que os 73% registrados no mesmo período do ano passado, mas ainda é maior do que os 24% registrados em 2021, ano da última grande seca. Além disso, os rios da Região Norte atingiram o menor nível dos últimos cem anos.
— Não é um cenário de racionamento, mas de atenção e preços elevados. Até dezembro, há uma perspectiva de manutenção da bandeira vermelha patamar 2. Se as chuvas acontecerem, em janeiro poderemos ter bandeira amarela. Será um verão de energia cara, como em 2022.
Já a alimentação no domicílio subiu 0,56% após dois meses de queda. Só as carnes aumentaram quase 3%, a maior alta desde dezembro de 2020. Algumas frutas, como laranja, limão e mamão, ficaram mais caras em setembro.
— É importante lembrar que tivemos quedas observadas ao longo de quase todo o primeiro semestre de 2024, com alto número de abates. Agora, o período de entressafra está sendo intensificado pela questão climática — explica André Almeida, gerente do IPCA no IBGE.
Andréa Angelo, estrategista de inflação da Warren Investimentos, avalia que a alta das carnes deve seguir em outubro, com previsão de reajuste de 3,7%, chegando a 8,75% no ano:
— Para 2025, temos alta maior (das carnes), de 12%. Este movimento reflete a oferta menor com impacto da seca recente.
Inflação de serviços
Apesar da alta recente nos preços de alimentos e energia, o economista André Braz, coordenador do Índice de Preços do Ibre/FGV, pondera que a trajetória dos juros no país não deverá ser influenciada por estas questões sazonais.
Segundo ele, o foco do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central está na demanda interna e na inflação dos próximos anos. Por isso, faz sentido que analistas do mercado esperem um aumento de 0,5 ponto percentual na próxima reunião para definir a taxa Selic, hoje em 10,75% ao ano.
— O mercado de trabalho está aquecido. O desemprego baixo aquece os salários, e, com isso, a inflação sobe, pois a demanda está mais forte.
Maluf, da XP, avalia que a inflação de serviços não sinaliza melhora sustentável no médio prazo, a despeito da desaceleração pontual em setembro. É um indicador acompanhado com lupa pelo Banco Central, pois indica o aquecimento, ou não, da economia. Fora de 0,24% em agosto, caindo para 0,15% no mês passado:
— A inflação de serviços, especialmente os mais intensivos em mão de obra, deve aumentar nos próximos trimestres, com possível desaceleração apenas no fim de 2025.
Houve queda de preços no grupo de despesas pessoais, com recuo de 0,31%. O subitem cinema, teatro e concertos ficou 8,75% mais barato no mês, puxado pela “semana do cinema”. Diversas redes praticaram preços promocionais durante uma semana.
Acima da meta
Quem projetava inflação abaixo do teto da meta, de 4,5%, começou a revisar o número para cima após a divulgação do IPCA de setembro. É o caso de Luis Otavio Leal, economista-chefe da G5 Partners. Ele subiu a projeção anual do IPCA de 4,4% para 4,6%.
Segundo o economista, 2024 foi um ano com dois grandes eventos climáticos: primeiro o El Niño e, mais recentemente, o La Niña. Esses fenômenos afetam a produção no campo e tendem a mexer com o custo dos alimentos:
— Os preços de alimentos devem subir este ano, em média, algo próximo de 8% e 9% do que 7%, diferente do que esperam muitos analistas.
Dependendo da energia
Economista da XP, Alexandre Maluf, destaca que a atual conjuntura levou a corretora a revisar na semana passada a projeção do IPCA anual de 4,4% para 4,6%. A revisão foi motivada principalmente por alimentos, especialmente proteínas, e energia elétrica. A estimativa incorpora manutenção da bandeira vermelha 2 em novembro e vermelha 1 em dezembro.
— Recentemente, houve uma melhora nas condições climáticas, com mais chuvas previstas para outubro, o que pode trazer algum alívio. Mas ainda estamos longe de uma perspectiva de bandeira amarela. O clima é imprevisível e prever inflação é mais difícil ainda — diz Maluf.
Mas a previsão não é unânime. André Braz, coordenador do índice de preços do FGV/Ibre, tem expectativa de alta entre 4,2% e 4,5%. Seu número final dependerá das bandeiras tarifárias a serem aplicadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), explica o economista:
— A bandeira que fechará o ano vai depender da regularidade e intensidade das chuvas. Se elas não forem intensas e regulares, pode ser que 2024 feche com alguma bandeira. E isso faz toda a diferença. Só no resultado do IPCA de setembro, metade da alta foi em função da bandeira vermelha patamar 1. O mesmo deve ocorrer em outubro.