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ECONOMIA

Veja o que pode mudar na aposentadoria de servidores estaduais e municipais se Congresso unificar regras

25 de outubro, 2024 / Por: Agência O Globo

Em discussão na Câmara, PEC unifica regras de União, estados e municípios. Texto também permite negociar dívidas e limita precatórios

Veja o que pode mudar na aposentadoria de servidores estaduais e municipais se Congresso unificar regras
Agência do INSS — Foto: Ministério da Previdência Social

Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) já aprovada no Senado quer retomar parte da discussão da Reforma da Previdência de 2019 para obrigar estados e municípios a adotarem, ao menos, as mesmas condições do regime próprio dos servidores da União.

Cinco anos após a aprovação da mudança nas regras gerais da aposentadoria, alguns estados e a maioria dos municípios com regime próprio têm critérios de acesso ao benefício mais brandos que a União, prejudicando finanças locais, segundo especialistas.

O texto da PEC 66 foi aprovado sem chamar muita atenção no Senado e está em discussão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. Ele prevê que os regimes próprios de previdência social (RPPS) de estados, Distrito Federal e municípios seguirão as mesmas regras da União, exceto se adotarem “regras mais rigorosas quanto ao equilíbrio financeiro e atuarial”.

O projeto dá prazo de 18 meses para que os governos regionais promovam alterações. Caso contrário, passa a valer imediatamente o ordenamento hoje vigente para os benefícios federais.

Dentre as principais mudanças realizadas pela Reforma da Previdência de 2019 para os servidores está o aumento da idade mínima para aposentadoria. Antes de 2019, os funcionários públicos do sexo masculino precisavam de 60 anos de idade e 20 anos de contribuição e do sexo feminino, 55 anos de idade e 20 anos de contribuição.

Com a reforma, a idade mínima passou para 65 anos e 62 anos, respectivamente, além de, ao menos, 25 anos de contribuição, dez anos no serviço público e cinco anos no último cargo. Mas foram criadas duas regras de transição para quem já estava na ativa.

Na primeira, o servidor soma idade e tempo de contribuição. Neste ano, a pontuação é de 91 para mulheres e 101 para homens. Mas, além dos pontos, é preciso cumprir idade mínima — 57 anos (mulheres) e 62 anos (homens) — e tempo de contribuição mínimo — 35 anos para os homens e 30 anos para as mulheres. Eles precisam estar há 20 anos no setor público e há cinco anos no cargo.

Há ainda a regra do pedágio, que prevê que o servidor paga 100% do tempo que falta para se aposentar de acordo com as regras antigas. Ou seja, se na época da reforma faltavam quatro anos para se aposentar, o servidor teria de trabalhar por oito anos. Mas há também exigência de idades mínimas, de 57 para as mulheres e 60 para homens.

Em relação à unificação de regras, a Reforma da Previdência só obrigou os entes federativos a criarem regimes de Previdência complementar e a ajustarem a alíquota de contribuição, seja a progressiva adotada pela União (7,5% a 22%) ou uma taxa mínima de 14%.

Na prática, a PEC 66 quer retomar as regras vigentes até 2019, quando as condições de acesso ao benefício eram iguais para os funcionários públicos da União, estados e municípios. Havia liberdade apenas para definir as alíquotas de contribuição previdenciária e eventuais cotas extras para cobrir o déficit.

‘PEC paralela’

Na tramitação da reforma, a discussão sobre os servidores de estados e municípios foi separada da proposta original e colocada na chamada PEC paralela, que ficou travada na Câmara. Assim, governos regionais ficaram livres para adotar as próprias regras, o que causa distorções por todo o país.

Das 27 unidades federativas, o Distrito Federal e mais seis estados (Amazonas, Roraima, Amapá, Maranhão, Pernambuco e Tocantins) não alteraram suas legislações.

Dentre os municípios, são 2.092 que têm regime próprio, dos quais apenas 755 adequaram as regras à reforma previdenciária de 2019, ou 36,09%, segundo o painel de acompanhamento mantido pelo Ministério da Previdência Social.

Nas capitais, 15 não atualizaram o regramento: Rio Branco, Maceió, Macapá, Manaus, Goiânia, São Luís, Cuiabá, Belo Horizonte, Belém, Rio de Janeiro, Porto Velho, Boa Vista, Florianópolis, Aracaju e Palmas.

O economista Rogério Nagamine acrescenta que, dentre os estados que alteraram suas legislações, 12 definiram regras mais brandas que as da União: Rondônia, Acre, Tocantins, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Alagoas, Sergipe, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Santa Catarina.

— Tem muita regra diferente, fica uma salada. No caso dos municípios, o levantamento mostra que dois em cada três não fizeram reforma ou não fizeram nos moldes da Emenda 103 (Reforma da Previdência). O ideal é que todo mundo tenha a mesma regra, mas os parlamentares não quiseram ter o ônus político com servidores municipais e estaduais e ficou uma bagunça — diz Nagamine, lembrando que a pressão do funcionalismo é maior sobre prefeitos, vereadores, governadores e deputados estaduais.

Equilíbrio fiscal

Segundo o ex-secretário de Previdência Leonardo Rolim, a diferenciação imposta está causando grandes injustiças e déficits previdenciários maiores nos locais em que não houve qualquer reforma ou que as regras ficaram muito mais brandas.

Ele cita, por exemplo, que professores do ensino fundamental do Distrito Federal são beneficiados em relação aos pares de cidades goianas próximas que fizeram reformas, como Novo Gama, a menos de 1 hora do centro de Brasília, com cinco anos a menos para conseguir acesso à aposentadoria.

— O déficit atuarial dos municípios está em R$ 1,1 trilhão, o dos estados, em R$ 3,1 trilhões. Se somar o da União (R$ 1,5 trilhão), dá praticamente outra dívida do país — disse o ex-secretário da Previdência, acrescentando que a alíquota extraordinária média para cobrir o déficit é de 16% no país. — Não é por acaso que ninguém mais consegue fazer investimento em infraestrutura, só o básico e o obrigatório. E mais ou menos um terço dos municípios não tem dinheiro para pagar o básico.

Para ele, a medida prevista na PEC 66 é benéfica para os municípios e vai colocar “ordem na casa”. Nagamine avalia que a obrigação vai significar redução da despesa previdenciária no médio e longo prazo.

— É importante fazer a correção do retrocesso que teve em 2019 de aplicar regra diferente para os servidores estaduais e municipais — disse Nagamine.

Após a PEC paralela, já houve tentativas de igualar as regras para os servidores de todo o país, como a PEC 38, elaborada pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) e encampada por um grupo de deputados.

No caso da PEC 66, o texto original tratava apenas do parcelamento das dívidas previdenciárias dos municípios e da limitação do pagamento dos precatórios das prefeituras — ordens de pagamento decorrentes de decisões judiciais definitivas.

A adequação dos regimes próprios dos entes federativos à Reforma da Previdência foi incluída em substitutivo apresentado no plenário do Senado pelo relator, senador Carlos Portinho (PL-RJ). A mudança foi feita, segundo ele, após amplo diálogo com o Poder Executivo e sugestões por parte do Ministério da Fazenda.

A medida, porém, gera revolta entre servidores estaduais e municipais. O Fórum das Carreiras de Estado (Fonacate) manifestou preocupação com a proposta, especialmente com a obrigação de realização de novas reformas pelos governos regionais, ainda que já tenham aprovado mudanças nos regimes próprios.

Para o Fonacate, há violação do pacto federativo e a autonomia dos entes subnacionais, “ao impor uma obrigação que desconsidera as peculiaridades e necessidades locais”.

— Por que um estado ou município, que está com as contas em dia, tem que aumentar sua contribuição? — diz a secretária-geral do Fonacate, Rivana Ricarte.

Renegociação de dívidas

A PEC também prevê outras medidas para aliviar o caixa dos municípios: o parcelamento de dívidas previdenciárias e a limitação de pagamento de precatórios — que são ordens de pagamentos decorrentes de decisões judiciais definitivas. Dados do Senado apontam que a dívida previdenciária dos municípios totaliza cerca de R$ 200 bilhões.

O texto permite o parcelamento em até 25 anos das contribuições previdenciárias e demais débitos dos municípios com os respectivos regimes próprios de previdência social, inclusive aqueles que já foram parcelados anteriormente.

A proposta também dá as mesmas condições para a quitação de dívidas municipais com o regime geral de previdência social (RGPS, do INSS) para as cidades que optaram por esse sistema para pagar a aposentadoria de seus servidores.

A Taxa Selic será a única balizadora da correção e dos juros. De acordo com o relatório final do Senado, o impacto da PEC é de R$ 1,54 bilhão em 2024; R$ 1,73 bilhão em 2025; R$ 1,86 bilhão em 2026; e R$ 1,98 bilhão em 2027.

Além do parcelamento, a proposta cria limites para pagamentos de precatórios que variam de 1% a 5% da receita corrente líquida (RCL) do ano anterior a depender do tamanho do saldo devido.

A PEC teve várias contribuições da Fazenda, como estabelecer a Selic como a taxa para a correção e a inclusão de menção expressa à responsabilização dos gestores municipais para o caso em que haja inadimplência injustificada por parte dos municípios.

Para o ex-secretário de Previdência Leonardo Rolim, essa medida é positiva, pois vai dar alívio aos municípios que estão no vermelho e torna factível o pagamento da dívida:

— Não é interessante para a União ter dívida que não será paga.


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