Motta trava PL da Dosimetria após Senado sinalizar ser contra discutir redução de penas
15 de outubro, 2025
| Por: Agência O Globo
Líderes temem que texto seja aprovado pela Câmara e senadores decidam engavetar
Presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta no Palácio do Planalto — Foto: Mario Agra / Câmara dos Deputados
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), decidiu segurar as articulações envolvendo o projeto que reduz as penas para aqueles que participaram de atos golpistas. Conhecido como PL da Dosimetria, o texto pode beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro. Líderes partidários dizem que uma falta de acordo com o Senado travou as negociações e tem impedido o relator, o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), de apresentar o parecer.
Motta, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), o relator e líderes partidários da Câmara participaram de uma reunião na semana para discutir a iniciativa. Segundo relatos, Alcolumbre criticou o projeto na reunião e indicou que haveria dificuldades para ele ser aprovado pelo Senado.
Mesmo assim, integrantes da Câmara que participaram do encontro tinham a expectativa de que Alcolumbre procurasse líderes do Senado para ajustar um texto que fosse de comum aceitação entre as duas Casas, o que não aconteceu.
Pelos planos traçados inicialmente pelo relator, os senadores trariam sugestões para o texto e, após isso, o parecer seria apresentado e o projeto votado pela Câmara nesta semana. Sem o retorno do presidente do Senado, Motta decidiu não incluir o projeto na previsão de votações da semana e tem evitado dar um prazo para o projeto ser analisado.
— Ninguém tem texto para discutir. Não sei o que eles estão querendo, nem o texto do Paulinho a gente conhece. Não tem acordo. Isso não é pauta minha, sou contra qualquer uma dessas coisas. Eu sou contra anistia a bandido que depredou o Congresso Nacional – disse o líder do PSD no Senado, Omar Aziz (AM).
O líder do partido, que é o segundo maior do Senado, evitou dizer se o Senado se recusaria a analisar o projeto, mas indicou que há dificuldades.
— Não sei se morre no Senado, é muito cedo para falar isso, mas não é tão simples assim (aprovar).
O entendimento é compartilhado pelo líder do PDT na Câmara, Mário Heringer (MG). O partido representado por ele foi uma das poucas bancadas que não se reuniu com Paulinho
– Caducou. Oposição perdeu o gás – declarou o pedetista.
O relator na Câmara passou as últimas semanas ouvindo as bancadas partidárias da Câmara e se reuniu com PL, PT, União Brasil, PP, Republicanos, MDB, PSD, PSDB, Podemos, Solidariedade, Avante, PRD e Novo. Com exceção do PT, que é contra reduzir penas e PL e Novo, que defendem uma anistia ampla, todas as bancadas se mostraram abertas a apoiar o relatório, mas aguardam a oficialização.
O entendimento é que o projeto de redução de penas tem ampla aceitação dos partidos de centro na Câmara e de uma parte da oposição, mesmo que o discurso do bolsonarismo seja por uma anistia ampla.
Ainda assim, há o temor que o Senado se recuse a analisar o projeto ou vote para rejeitar. Deputados temem uma reação popular contra a redução de penas. Algo similar aconteceu na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Blindagem, que dificulta investigações contra parlamentares. A PEC foi aprovada pela Câmara e, após reação popular, foi rejeitada pelos senadores.
Uma das versões do texto, que ainda não é definitiva porque o relatório não foi protocolado, reduz as penas e unifica os crimes de golpe de Estado e abolição violenta do Estado democrático de Direito, além de reduzir os crimes de dano qualificado e de deterioração de patrimônio tombado. Com isso, a pena de Bolsonaro no caso da trama golpista teria uma redução que poderia ser de 7 a 11 anos.
O relator também já disse que a sua versão da proposta vai ser o suficiente para tirar todos que hoje estão presos por estarem nos atos do 8 de janeiro de 2023.
Pauta de consenso
Motta manteve nesta semana a estratégia de votar apenas projetos sem atrito com o Senado. Desde a derrota na PEC da Blindagem, Motta tem apostado em uma gestão de previsibilidade — evitando ruídos com o Senado — e escolhendo votações de baixo risco, como o pacote de educação que dominou o plenário na terça-feira e retorna nesta quarta.
Antes, a Câmara já havia aprovado a MP dos Mais Especialistas, a ampliação da isenção do imposto de renda e o regime de urgência de oito propostas sobre segurança pública, todas votações sem atrito político. A leitura entre líderes é que ele tenta consolidar a imagem de um presidente que entrega resultados sem provocar crises.
A oposição, no entanto, tenta reabrir o debate sobre a dosimetria e cobrar posicionamento do plenário.
— Não sei quando o texto vota. Temos que resolver alguns problemas. Tem que ver ainda — disse o relator, Paulinho da Força (Solidariedade-SP).
Ao ser questionado se o impasse se deve à falta de entendimento com o Senado, o deputado respondeu:
— Vamos discutir. Quem sabe resolve.
A cautela de Motta nesta semana também tem origem no desgaste provocado pela Medida Provisória 1303, que tratava do IOF sobre investimentos no exterior e das isenções para LCI e LCA. Mesmo após semanas de negociações entre o ministro Fernando Haddad e o relator, Carlos Zarattini (PT-SP), a MP acabou derrubada na Câmara. A derrota irritou a base do governo e teria feito o presidente aderir novamente à estratégia de acalmar os ânimos.
Nos bastidores, deputados da base relatam que a avaliação é a de que o governo “remou e morreu na praia” — e que a Câmara não pode repetir o cenário de improviso e fragmentação que marcou aquela votação.
Aliados dizem que a nova postura é também uma tentativa de marcar distância de Arthur Lira (PP-AL), cujo estilo de empilhar pautas polêmicas. Motta, avaliam, prefere acumular pequenas vitórias que reforcem sua imagem de articulador confiável, mesmo que isso signifique abrir mão de protagonismo.
O pacote de educação, que inclui projetos como o piso salarial para professores temporários e incentivos a estudantes de licenciatura, tornou-se a vitrine dessa estratégia. Deputados afirmam que o tema reúne consenso entre as bancadas — prova disso é que oito propostas foram aprovadas em poucas horas, por unanimidade, nesta terça-feira.